Página:Turbilhão (Coelho Netto, 1919).djvu/208

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sofá, soluçando. Caindo a noite sem que houvesse notícia de Paulo, numa resolução desesperada, ela foi à caixa em que guardava as jóias e pôs-se a escolher algumas para levar ao penhor.

Quais haviam de ser? Tinha o crucifixo de ouro, velha relíquia de família, que fora de sua mãe; beijou-o e, veneradamente, pô-lo de parte, sobre o travesseiro. Tomou uma medalhinha esmaltada - os "olhos de Santa Luzia", figas de coral, de azeviche, que as crianças haviam usado contra o quebranto; depois uma grossa pulseira, dos anéis com pedras, uma fivela de ouro e a medalha do falecido com o monograma a brilhantes. Mirou-a muito tempo, com remorso, supesou-a, abriu-a: em cada uma das faces, sob lâminas de vidro, enroscava-se um anel de finos cabelos louros: eram dos filhos; retirou-os e, fechando a medalha, suspirou. Felícia acabava de limpar a cozinha, quando ela a chamou, dizendo: que iam sair. A negra encarou-a, espantada:

— Paulo não aparece, não sei por onde anda e eu não quero esse homem da casa aqui todos os dias. Vou empenhar umas jóias e, como não conheço as ruas...

— Se fosse de dia a gente podia ir ao Monte de Socorro, mas de noite, só nessas casas. Minh'ama quer ir assim mesmo?

— Vamos.

A negra foi vestir-se e, pouco depois, saíam