As Casadas Solteiras/III
Sala: portas laterais e no fundo; no meio, uma mesa. No segundo plano, à direita, um guarda-pratos, e à esquerda, duas meias pipas serradas pelo meio; cadeiras.
CENA I
[editar]Virgínia e Clarisse, sentadas junto à mesa, cosendo. Narciso, tendo um papel na mão..
NARCISO, entrando - Está pronto. Muito bem! Meninas, é preciso que assinem este papel.
VIRGÍNIA - E que papel é este?
NARCISO, apresentando-lhe o papel e uma pena - A procuração para anular vossos casamentos.
VIRGÍNIA - Ah, dê-me! (Toma o papel e assina.) Agora tu, Clarisse.
CLARISSE, toma o papel e assina - Está assinado.
NARCISO - Muito bem, muito bem, minhas filhas! Tudo está em regra. Não descansarei enquanto não vir anulados estes malditos casamentos. Casamentos! Patifes, hei de ensiná-los. Já estive esta manhã com o meu letrado, que me dá muito boas esperanças. Minhas filhas, espero em Deus e na Justiça, que amanhã estejais livres.
CLARISSE - Livres?
NARCISO - Sim, sim, e podereis casar-vos de novo com quem quiserdes.
VIRGÍNIA - Casarmo-nos de novo?
NARCISO - E por que não? Filhas, uma coisa vos quero eu pedir...
CLARISSE - O quê, meu pai?
NARCISO - Fugistes de minha casa; dois meses depois voltastes, e um só queixume ainda não ouvistes de vosso pai, que vos recebeu com os braços abertos.
VIRGÍNIA - Meu pai... (Levantando-se.)
CLARISSE, levantando-se - Ordenai.
NARCISO - Amanhã estareis livres, e espero que aceiteis os noivos que eu vos destino.
CLARISSE - Noivos?
VIRGÍNIA - E quem são eles?
NARCISO - Para ti será o amigo Serapião.
VIRGÍNIA - Serapião?
NARCISO, para Clarisse - E para ti, o vizinho Pantaleão.
CLARISSE - Pantaleão?
NARCISO - São duas dignas pessoas. Enfim, trataremos disso; talvez hoje vo-los apresente. Adeus, adeus, que é tarde. Vou daqui ao teatro. Já vos disse que hoje não janto em casa; por conseguinte, quando forem horas, não me esperem. Manda tirar estas vasilhas aqui da sala. (Sai.)
CENA II
[editar]As ditas e depois Henriqueta
VIRGÍNIA - Que me dizes a esta, mana? Eu, casada com um Serapião!
CLARISSE - E eu, com um Pantaleão!
VIRGÍNIA - Isto não pode ser...
CLARISSE - Que dúvida!
VIRGÍNIA - Até porque ainda nutro certas esperanças...
CLARISSE - E eu também.
HENRIQUETA, da porta - Dá licença?
VIRGÍNIA e CLARISSE - Henriqueta! Entra!
HENRIQUETA - Como passam vocês?
VIRGÍNIA - Bem, e tu?
HENRIQUETA - Vamos passando. Então, o que há de novo?
VIRGÍNIA - Muitas coisas... Amanhã estaremos completamente livres.
CLARISSE - E poder-nos-emos casar com Serapiões e Pantaleões.
HENRIQUETA - Hem? O que é isso?
CLARISSE - É cá um projeto do nosso pai.
HENRIQUETA - Um projeto?
VIRGÍNIA - Meu pai quer nos casar de novo.
HENRIQUETA - Sim? E vocês consentem em tal, e estão completamente resolvidas a abandonarem os pobres inglesinhos?
VIRGÍNIA - Não sei o que te diga...
CLARISSE - Sabes, Henriqueta, que eles estão cá no Rio?
HENRIQUETA - Sei. Ontem encontrei o teu, o Bolin, Bolin... Que maldito nome, que nunca pude pronunciar!
CLARISSE - Bolingbrok.
HENRIQUETA - Bolinloque a passear no Largo do Paço, vermelho como um camarão. Assim que avistou-me, veio direitinho para mim; mas eu que não estava para aturá-lo, fiz-me de esquerda e fui andando.
VIRGÍNIA - Há quinze dias que chegaram da Bahia, e atormentam-nos com cartas e recados.
HENRIQUETA - E já encontraste com ele?
VIRGÍNIA - Já, em um baile.
HENRIQUETA - E dançaste com ele?
VIRGÍNIA - Não.
CLARISSE - Por cinco ou seis vezes vieram convidar-nos para contradança, polca e valsa, mas nós, nada de aceitar.
HENRIQUETA - Coitados!
CLARISSE - E se tu visses a aflição em que eles estavam! Como viam que nós não os queríamos aceitar para pares, zangados e raivosos agarravam-se ao primeiro par que encontravam, e agora verás! Saltavam como uns demônios... Cada pernada!...
VIRGÍNIA - E na polca ia tudo raso, com pontapés e encontrões. Todos fugiam deles. Ah, ah!
HENRIQUETA - Assim é que os ingleses dançam; é moda entre eles.
CLARISSE - E depois iam para a sala dos refresco, e - grogue e mais grogue...
HENRIQUETA - Era para afogar as paixões. Ah, ah, ah!
VIRGÍNIA, rindo-se - Ah, ah, ah! Com que caras estavam!
CLARISSE, rindo-se - E eu a regalar-me de não fazer caso deles.
VIRGÍNIA - E sabes tu que hoje eles jantam conosco?
HENRIQUETA - Aqui?
VIRGÍNIA - Sim, mandamo-los convidar.
HENRIQUETA - Para mangarem com eles?
CLARISSE - Sim, e nos pagarem os dissabores por que passamos na Bahia. Vês aquelas dua vasilhas? É uma das manias de meu pai. Deu-lhe hoje para tingir o algodão de Minas que dá para roupa dos negros. Ali dentro ainda há um resto de tinta, e eu tenho cá um plano...
HENRIQUETA - E depois?
CLARISSE - Depois? Veremos...
VIRGÍNIA - Henriqueta, o que é feito de teu marido?
HENRIQUETA - Anda no seu lidar. Depois que perdeu tudo, fez-se procurador de causas... Pobre Jeremias! Mas eu sou bem feliz, porque ele agora ama-me. (Dentro dão palmas.)
CLARISSE - Dão palmas; são eles! Henriqueta, recebe-os, enquanto nos vamos preparar.
BOLINGBROK, dentro - Dá licença?
VIRGÍNIA - Vamos. (Sai com Clarisse.)
HENRIQUETA - Pode entrar. Isto há de ser bom!
CENA III
[editar]Henriqueta, Bolingbrok e John. Bolingbrok e John virão de calça e colete branco e casaca.
JOHN, da porta - Dá licença?
HENRIQUETA - Os senhores podem entrar.
JOHN, entrando - Minha senhora...
BOLINGBROK, para John - Este é mulher de Jeremias!
HENRIQUETA - Queiram ter a bondade de assentarem-se.
BOLINGBROK - No precisa; obrigada. Dona Clarisse?
JOHN - Posso falar com a senhora Dona Virgínia?
HENRIQUETA - Neste momento estão lá dentro, ocupadas. Terão a bondade de esperarem um pouco...
BOLINGBROK - Mim não pode espera; quer fala a ela já.
HENRIQUETA - Ui!
JOHN - Bolingbrok!
BOLINGBROK - Eu grita, chama ela. Clarisse? (Gritando:) Clarisse?
HENRIQUETA - Não grite, que já a vou chamar. Safa! (Sai.)
JOHN - Estais louco?
BOLINGBROK, passeando pela casa com passos largos - John, oh, oh, mim está zanga...
JOHN - E eu também não estou muito contente; mas enfim, é preciso termos paciência; estamos em casa de nossas mulheres.
BOLINGBROK - Yes, eu estar satisfeita de estar junto de Clarisse.
JOHN - E eu, de Virgínia. (Assenta-se.) Há três meses que as vimos pela primeira vez e lhe fizemos a corte; e eis-nos de novo obrigados a principiarmos...
BOLINGBROK, sempre passeando de um para outro lado - Yes, começa declaration outra vez...
JOHN - Que de acontecimentos, que de tribulações!... Mas tu é que és a causa de tudo isto.
BOLINGBROK, parando - Mim, John?
JOHN - Sim.
BOLINGBROK - Oh, este é forte! Culpada é tu, que dá conselho a mim. Maus conselhos.
JOHN - Sim? E tu, com estes maus modos?
BOLINGBROK - Oh, eu é que diz: minha ladrãozinho é mau, minha amorzinho é mau?... Oh, eu queixa de ti, e se ti não estar minha sócio... Eu dá soco.
JOHN, levantando-se - Tu é que precisas uma roda deles.
BOLINGBROK, chegando-se para John - Eu é que precisa, John? Eu é que precisa, John?
JOHN, gritando - É sim, maluco!
BOLINGBROK, gritando muito junto de John - Eu é que precisa, John?
JOHN, empurrando-o - Irra, não me ensurdeças!
BOLINGBROK - Oh! (Arregaçando as mangas:) John, vamos joga soco? Vamos, John? Eu quer quebra o nariz...
JOHN - Chega-te para lá!
BOLINGBROK - Oh!
CENA IV
[editar]Virgínia, Clarisse e os ditos.
CLARISSE, entrando - O que é isto, senhores?
BOLINGBROK, estático - Oh!
JOHN - Minhas senhoras, não é nada.
BOLINGBROK, cumprimentando - Minhas comprimentas.
JOHN - A bondade que tivestes de nos convidar...
VIRGÍNIA - Queiram assentar. (Puxam cadeiras e assentam-se na seguinte ordem: Virgínia e Clarisse à direita, e Bolingbrok e John à esquerda, e em distância.)
JOHN, tossindo - Hum, hum!
BOLINGBROK, tossindo - Hum, hum! (As duas sorriem-se.)
JOHN - O dia hoje está fresco...
BOLINGBROK - Está bonita dia...
JOHN - E creio que teremos chuva...
BOLINGBROK - Muita chuva; a tempo está perturbada...
VIRGÍNIA, sorrindo-se - Bem vejo que está perturbado.
CLARISSE, desatando a rir - E muito... Ah, ah!
BOLINGBROK - Oh!
JOHN - Enfim, senhoras, temos a felicidade de vos falar sem testemunhas.
BOLINGBROK - E de nos achar junta de vós.
JOHN - E esse obséquio fez-se tanto esperar!
BOLINGBROK - Yes... Mim estava sequiosa para vos ver.
CLARISSE - Sequioso? Quer um copo de água com açúcar?
BOLINGBROK - No, no. I thank you.
CLARISSE - Não faça cerimônia... Parece-me tão alterado.
BOLINGBROK, levantando-se - No quer! Oh!
JOHN, levantando-se - Senhoras, este cerimonial muito pesa depois de tão longa ausência. Não seria melhor deixarmos de lado estes modos polidos, reservados, e falarmos sinceramente?
VIRGÍNIA, levantando-se - Como quiserdes, mas lembrai-vos das condições mediante as quais vos concedemos esta entrevista - nem uma palavra sobre o passado.
JOHN - Recusais ouvir a nossa justificação?
BOLINGBROK - Oh, não dá orelha a nós?
JOHN - Se temos culpa, vós também a tendes.
VIRGÍNIA - Nós, senhor?
BOLINGBROK - Yes.
JOHN - Sem dúvida! Abandonar-nos!...
VIRGÍNIA, com gravidade - Senhores, vós pensastes que depois de nos enganar cruelmente, sujeitar-nos-íamos, de boa vontade, a ser vossas escravas? Muito vos iludistes! Felizmente recobramos a nossa liberdade, e estamos resolvidas a não sacrificá-la de novo.
CLARISSE - O vosso proceder foi uma traição indigna.
BOLINGBROK - My Clarisse!
JOHN - Virgínia, nunca me amaste...
VIRGÍNIA - Mas convenha que muito pouco foi feito para alcançar o meu amor.
CLARISSE - Basta; deixemos de recriminações. Os senhores farão o obséquio de jantarem conosco.
BOLINGBROK, contente - Oh, by God!
JOHN, contente - É isto para nós de grande satisfação.
BOLINGBROK, à parte, para John - Elas inda gosta de nós, John. (Alto, e muito risonho:) Eu está muito satisfeita, muito contente janta com vós. Ah, ah, ah!
VIRGÍNIA - Henriqueta, nossa amiga, jantará conosco.
BOLINGBROK - Henriqueta, mulher de Jeremias? Jeremias está traidor.
CLARISSE - Jeremias é uma pessoa de nossa amizade.
BOLINGBROK - Oh, pardon! Então é minha amiga.
VIRGÍNIA - Um favor que lhe quisera eu pedir...
JOHN - Ordenai.
VIRGÍNIA - Henriqueta gosta muito de empadas e pão-de-ló; se quisesse ter a bondade de ir ali à confeitaria e comprar...
JOHN - Oh!
VIRGÍNIA - Como? Não quereis?
JOHN - Eu vou, eu vou. (Sai apressado.)
CLARISSE - Se eu achasse quem quisesse ir comprar alface para salada...
BOLINGBROK - Eu vai, Miss, eu vai.
CLARISSE - Quer ter esse incômodo?
BOLINGBROK - Incômodo não; dá prazer, basta, eu faz... Eu compra alface, batata, repolha e nabos; eu traz tudo... Está muito satisfeita. Eu volta. (Sai.)
CENA V
[editar]Virgínia, Clarisse e Henriqueta. Virgínia e Clarisse, logo que Bolingbrok sai, caem assentadas nas cadeiras e riem-se às gargalhadas.
HENRIQUETA, entrando - O que é? De que se riem? Que é deles?
VIRGÍNIA, rindo-se - Ah, ah, ah! Isto é delicioso!
CLARISSE, rindo-se - Ah, ah, ah! É magnífico!
HENRIQUETA - Acabem de rir, e digam-me o que é.
CLARISSE - O meu ex-marido foi comprar alfaces e couves...
VIRGÍNIA - E o meu, empadas e pão-de-ló. Ah, ah!...
HENRIQUETA - Eles mesmos? Tão orgulhosos como são?
VIRGÍNIA - Pois então? É que o caso mudou de figura. Na Bahia nem queriam carregar o nosso chapelinho-de-sol.
CLARISSE - E agora carregarão tudo quanto quisermos.
HENRIQUETA - Assim são os homens... Ou mansos cordeiros quando dpendem, ou bravios leões quando nos governam. Ah, se não precisássemos deles...
CENA VI
[editar]Jeremias e os meninos. Jeremias virá vestido muito ordinariamente.
JEREMIAS - Viva!
VIRGÍNIA e CLARISSE - Sr. Jeremias!
JEREMIAS - Como passam?
VIRGÍNIA e CLARISSE - Bem.
HENRIQUETA - Que fazes tu por aqui a estas horas?
JEREMIAS - Vim falar com estas senhoras.
VIRGÍNIA - Conosco?
JEREMIAS - Nem mais, nem menos.
CLARISSE - E para quê?
JEREMIAS - Seu pai encarregou ao seu procurador estes papéis. (Mostra-lhe uns papéis.) É o auto de anulação do vosso casamento com os meus amigos ínglis. O procurador, porém, que é um procurador muito procurado e tem muito que fazer, encarregou-me de dar andamento aos papéis. Não sei se já tive a distinta de lhes participar que dpois que não soube dirigir o que era meu, trato de negócios dos outros...
CLARISSE - Já sabemos, que no-lo disse Henriqueta.
JEREMIAS - Muito bem. Recebi os papéis, e lançnado os olhos sobre eles, li os vossos nomes, o dos nossos caríssimos amigos e a causa de toda a barulhada, e disse cá com os meus botões: isto pode ser maroteira do velho Narciso das Neves, e ainda vejo aqui a assinatura de suas filhas, não façamos nada sem consultá-las... Pus-me a caminho e eis-me aqui.
VIRGÍNIA - Muito lhe agradecemos.
JEREMIAS - Não há de quê.
HENRIQUETA - És um excelente rapaz.
JEREMIAS - Obrigado. Mas então, que querem que eu faça? Dá-se andamento aos papéis, ou não?
CLARISSE - Responde tu Virgínia.
VIRGÍNIA - E por que não respondes tu?
HENRIQUETA - Ah, já sei! Nenhuma quer responder, para ao depois não ter do que se arrepender. Pois decidirei eu.
JEREMIAS - Ainda bem. Sempre te conheci com resolução.
HENRIQUETA - Não dê andamento a esses papéis.
CLARISSE - E por que?
HENRIQUETA - Porque bem depressa se arrependerão. Falemos claramente; vocês ainda conservam esperanças...
VIRGÍNIA - E quem te disse?
HENRIQUETA - Isso não é preciso que se diga; adivinha-se.
CLARISSE - Pois bem, sejamos sinceras. Sr. Jeremias, nós ainda amamos os nossos ingratos, e nem poderemos esquecer-nos que por eles fugimos desta casa, e que para eles vivemos dois meses... Nós, mulheres, não somos como os senhores; o nosso amor é mais constante e resiste mais tempo.
HENRIQUETA - Estás ouvindo?
CLARISSE - Mas em compensação, somos vingativas. Os nossos caros ex-maridos hão de primeiro pagar com usura o que sofremos, se quiserem ser perdoados. Hão de se curvar como nós nos curvamos, e obedecerem à nossa voz com humildade... Assim, talvez, nos dignemos perdoá-los.
JEREMIAS - Bravíssimo! Vou fazer com estes papéis o que fazem todos os procuradores, meus colegas - dormir no caso...
CENA VII
[editar]Entra Bolingbrok com dois grandes samburás pendurados nos braços, cheios de hortaliças e frutas. Segue-o John com uma empada em uma mão e um pão-de-ló na outra.
BOLINGBROK, entrando - Está alface e repolha, Miss.
CLARISSE - Oh, muito bem.
JOHN - E a empada e pão-de-ló.
VIRGÍNIA - Andaram diligentes.
BOLINGBROK - Para ser agradável a vós.
HENRIQUETA - Dá cá a empada.
JEREMIAS, ao mesmo tempo - Dá cá um samburá.
BOLINGBROK - Jeremias está aqui!
JEREMIAS - Yes, my dear, dá samburá a mim. Oh, homem, compraste o mercado inteiro? (Depositam tudo sobre a mesa.)
BOLINGBROK - Para faze salada. (Indo para Clarisse:) Miss está contente?
CLARISSE, reprimindo o riso - Muito.
BOLINGBROK - Mim então está muito satisfeita.
VIRGÍNIA - Tratemos do mais.
JOHN - Querem ainda outra empada?
BOLINGBROK - Mais repolha e nabas?
VIRGÍNIA - Não, mas enquanto vamos lá dentro ver em que estado está o jantar, aqui está a mesa, e naquele guarda-pratos tudo o que é necessário para ela.
CLARISSE - E os senhores terão a bondade de arranjarem isto.
BOLINGBROK - Eu bota mesa? Oh!
JOHN - Querem que preparemos a mesa?
BOLINGBROK, à parte - Oh, este é muito! (Alto:) Mim não sabe faz doméstico; não quer.
CLARISSE - Ah, não quer? Está bem. (Mostrando-se zangada.)
JOHN - Pelo contrário, aceitamos o encargo com muito prazer. (Para Bolingbrok:) Cala-te, que botas tudo a perder. (Alto:) Não é verdade Bolingbrok, que temos nisso muito prazer?
BOLINGBROK - Oh, yes. ( parte:) Goddam! (Esforçando-se para rir:) Está contente bota mesa para nós janta; muito bom, está satisfeita, muito... ( parte, raivoso:) Goddam!
CLARISSE, com ternura - E eu te agradeço.
BOLINGBROK - Te agradeçe? Oh, oh! (Muito alegre.)
VIRGÍNIA - Mãos à obra! Tirem a toalha e pratos.
JEREMIAS - Melhor será que os senhores tirem primeiro as casacas; assim não podem servir bem.
VIRGÍNIA, CLARISSE e HENRIQUETA - É verdade!
BOLINGBROK - Mim não tira casaca!
CLARISSE - Também não pedimos nada coisa alguma que os senhores façam de boa vontade! É sempre de mau modo.
BOLINGBROK - Eu tira. John, tira casaca. (Despem ambos as casacas. As três riem-se às escondidas.)
JEREMIAS - Agora sim, parecem-se mesmo uns criados ingleses.
VIRGÍNIA - Henriqueta, vamos ver o jantar. Já voltamos. (Saem as três, rindo-se.)
CENA VIII
[editar]Bolingbrok, John e Jeremias.
JEREMIAS, da extremidade direita da sala, observa, rindo-se, os dois, que abrindo o guarda-prato, tiram dele toalhas, pratos, etc. - Eis aí está como se abate o orgulho. São meus amigos, e verdade, mas estimo muito que isto lhes aconteça. Oh, se pudéssemos assim abater a proa a outros muitos inglismanes que eu conheço... (Alto:) John, põe esta mesa direito! Bolingbrok, adio, my dear, farewell... Good night. (Sai.)
CENA IX
[editar]Bolingbrok e John.
JOHN, pondo a mesa - Então, que me dizes a isto?
BOLINGBROK, pondo a mesa - Eu está envergonhada. Quem dize que William Bolingbrok limpa pratas como uma cozinheiro, e carrega repolha e samburá?
JOHN - Que queres? Com submissão e paciência é que as tornaremos favoráveis... Cada vez a amo mais.
BOLINGBROK - Eu também, John. As garfos fica aqui... Mim está maluco por Clarisse.
JOHN - Aqui governam elas; lá governávamos nós.
BOLINGBROK - Yes. Nós está cativa aqui. Este é desagradával, mas está satisfeita de serve ela.
CENA X
[editar]Entram Virgínia, Clarisse e Henriqueta, apressadas.
VIRGÍNIA, entrando - Escondam-se!
CLARISSE, entrando, ao mesmo tempo - Escondam-se!
HENRIQUETA - E depressa!
BOLINGBROK - O que é?
JOHN, ao mesmo tempo - O que foi?
CLARISSE - Meu pai aí vem, e se aqui os encontra, estamos perdidas!
BOLINGBROK - Oh, que fazer?
HENRIQUETA - Escondam-se, escondam-se!
JOHN - Mas onde? Onde?
VIRGÍNIA - Dentro daquelas pipas.
CLARISSE - É verdade! Andem, andem! (As três empurram-nos para junto das meias pipas. Henriqueta levanta a tampa de madeira que as cobre.)
HENRIQUETA - Entrem!
JOHN - Oh, estão com água!
BOLINGBROK - É tinta, John!
VIRGÍNIA - E o que tem isso? Entrem!
CLARISSE - Por quem sois, entrai, senão morreremos!
BOLINGBROK - Entra, John.
JOHN - Entrar? Mas a tinta?
VIRGÍNIA - É assim que nos amais?
HENRIQUETA - Peior é a demora.
VIRGÍNIA - Meu John, compadece-te de mim!
CLARISSE - Meu Bolingbrok, só assim te perdoaremos, e tornarei a amar-te.
HENRIQUETA - Entrem, entrem!
BOLINGBROK - John, entra; elas torna ama a nós. (Bolingbrok e John entram nas pipas; as moças cobrem-nas com as tampas e, trepando sobre ela, dançam e riem-se.)
HENRIQUETA - Ah, ah, ah, que belo ensino!
VIRGÍNIA - Agora sim, estamos vingadas!
CLARISSE - Quantas casadas conheço eu que invejam agora a nossa posição... (Dança.)
HENRIQUETA - Está bom; não se demorem muito, que eles podem morrer.
VIRGÍNIA, saltando - Morrer? Isso não! Morto não me serve de nada.
CLARISSE, saltando - Para ensino, basta.
HENRIQUETA - Sinto passos...
VIRGÍNIA - Quem será?
NARCISO, dentro - Diga que o espero.
CLARISSE - É meu pai.
VIRGÍNIA - Oh, com esta não contava eu! Que faremos?
HENRIQUETA - Ora, eis aí está! Vocês foram meter medo aos pobres ingleses com a vinda de seu pai, e ele chega sem ser esperado...
CENA XI
[editar]Narciso e as ditas.
NARCISO, entrando - Ai, que estou estafado! Muito tenho andado (sentando-se), e muito conseguido...
CLARISSE - Meu pai resolveu-se a jantar em casa?
NARCISO - Sim, estou com muitas dores de cabeça, e o jantar fora incomodar-me-ia... Mas quê? Esta mesa...
HENRIQUETA, à parte - Mau...
NARCISO - Tantos talheres?
VIRGÍNIA - Henriqueta e seu marido jantavam conosco.
NARCISO - Ah, está bom. Acrescentem mais dois talheres.
CLARISSE - Para quem?
NARCISO - Para os amigos Serapião e Pantaleão.
VIRGÍNIA - Pois vêm jantar conosco?
SERAPIÃO, dentro - Dá licença?
NARCISO - Ei-los. (Levantando-se:) Podem entrar. (Indo ao fundo.)
CLARISSE, para Virgínia e Henriqueta - E então?
VIRGÍNIA - Não sei no que isto dará...
CENA XII
[editar]Serapião, Pantaleão e os ditos. Serapião e Pantaleão virão vestidos como dois velhos que são, e muito estúrdios.
NARCISO - Sejam muito bem-vindos, meus caros amigos.
CLARISSE, à parte - Oh, que figuras!
SERAPIÃO - Deus esteja nesta casa.
PANTALEÃO - Humilde criado...
NARCISO - Entrem, entrem, meus caros amigos; aqui estão elas. Hem? Que vos parecem?
SERAPIÃO - Encantados!
PANTALEÃO - Belas como os amores!
NARCISO - Bravo, amigo Pantaleão, como estais expressivo! Meninas, então? Cheguem-se para cá; é dos senhores que eu há pouco vos falava. (Aqui Bolingbrok e John levantam as tampas das pipas e observam.)
VIRGÍNIA - Muita satisfação tenho em conhecer ao Sr....
SERAPIÃO - Serapião.
VIRGÍNIA - Serapião.
CLARISSE - E eu, o Sr....
PANTALEÃO - Pantaleão.
CLARISSE - Pantaleão.
HENRIQUETA - Jibóia!...
NARCISO - Virgínia, Clarisse, minhas caras filhas, dar-me-eis hoje a maior satisfação com a vossa obediência. A estas horas, sem dúvida, estará lançada a sentença que anula o vosso primeiro casamento, e dentro de oito a quinze dias espero que estejais unidas aos meus dignos amigos.
SERAPIÃO - Grande será a nossa felicidade...
PANTALEÃO - E contentamento.
NARCISO - E já me tarda ver este negócio concluído, porque, na verdade, ainda temo os tais inglesinhos.
SERAPIÃO - Que apareçam, e verão para quanto prestamos!
PANTALEÃO - Sim, sim, que apareçam! (Enquanto Serapião e Pantaleão falam, Bolingbrok e John levantam das pipas e saltam fora. Suas roupas, caras, mãos estarão o mais completamente tintas que for possível, isto é, Bolingbrok todo de azul e John de vermelho. Atiram-se sobre Serapião e Pantaleão, que dão gritos, espavoridos.)
BOLINGBROK - Goddam! Goddam!
JOHN - Aqui estamos!
NARCISO, assustadíssimo, corre para a porta do fundo, gritando - Ai, ai, é o diabo, é o diabo! (Jeremias, que entra nesse instante, esbarra-se com ele e rolam ambos pelo chão. As três moças recuam para junto da porta da direita. Serapião e Pantaleão caem de joelhos, a tremerem. Bolingbrok e John gritam, enfurecidos.)
BOLINGBROK - Ah, tu quer casa, quer mulher a mim? Goddam!
JOHN - Pensas que assim há de ser, velho do diabo?
JEREMIAS, caindo - Que diabo é isso?
NARCISO, gritando - Ai, ai! (Levanta-se, quer fugir; Jeremias o retém.)
JEREMIAS - Espere! Aonde vai?
NARCISO - Deixe-me, deixe-me! (Bolinbrok e John a este tempo têm deixado Serapião e Pantaleão caídos no chão; dirigem-se para Virgínia e Clarisse.)
JOHN, abraçando Virgínia - Não te deixarei mais!
BOLINGBROK, ao mesmo tempo, abraçando Clarisse - Mim não deixa mais vós.
VIRGÍNIA - Ai!
CLARISSE, ao mesmo tempo - Ai!
HENRIQUETA, indo para Narciso - Senhor Narciso, Não se assuste!
JEREMIAS, puxando para frente - Venha cá.
JOHN, abraçado com Virgínia - Matar-me-ão junto de ti, mas eu não te deixarei... Não, não, Virgínia.
VIRGÍNIA - Não me suje de tinta!
BOLINGBROK, abraçado com Clarisse - Esfola a mim, mas eu não larga a vós! No, no!
JEREMIAS, que a este tempo tem obrigado Narciso a aproximar-se dos ingleses - Está vendo? São os primeiros maridos de suas filhas.
HENRIQUETA - Os ingleses.
NARCISO - Os ingleses? (Enfurecido, para os dois:) Ingleses do diabo, goddams de mil diabos, que fazem em minha casa? Larguem minhas filhas, ou eu sou capaz de... (Bolingbrok e John deixam as mulheres e atiram-se sobre Narciso e seguram-no.)
JOHN - Maldito velho!
BOLINGBROK, ao mesmo tempo - Velho macaco!
NARCISO - Ai, deixem-me!
JEREMIAS - John! Bolingbrok!
JOHN - Quero minha mulher!
BOLINGBROK, ao mesmo tempo - Minha mulher, macaco!
NARCISO - Diabos, diabos!
VIRGÍNIA, para John - Deixe meu pai!
CLARISSE, para Bolingbrok - Largue! Largue! (Ambas, ajudadas por Jeremias e Henriqueta, puxam os ingleses, que se mostram enfurecidos contra Narciso. Neste tempo, Serapião e Pantaleão estão de pé, olhando muito para o que se passa.)
NARCISO, vendo-se livre dos ingleses - Haveis de pagar-me, ingleses do inferno! Patifes!
BOLINGBROK - Larga a mim, Jeremias; quer dar soco...
NARCISO, para Serapião e Pantaleão - Amigos, ide chamar meirinhos, soldados, a justiça, para prender estes dois tratantes quie desencaminharam minhas filhas.
JOHN, sempre seguro - Virgínia é minha mulher!
BOLINGBROK, sempre seguro - Clarisse é mulher a mim!
NARCISO - Isso veremos! O casamento está anulado. A sentença a estas horas estará lavrada.
JEREMIAS, adiantando-se - Ainda não está.
NARCISO - O quê?...
JEREMIAS - O procurador de Vossa Senhoria, o Sr. Moreira, por ter muito o que fazer, entregou-me os autos em que se tratava de cancelar o casamento de suas filhas, para eu dar andamento a eles. Deixei um instante sobre a minha mesa e os meus pequenos o puseram neste estado... (Assim dizendo, tira da algibeira da casaca uma grande porção de papel cortado em tiras estreitas.)
NARCISO - Oh! (Tomando algumas tiras de papel e examinando-as:) Oh, é a minha letra! A assinatura... Não tem dúvida! (Para Jeremias:) Que fizeste? (Bolingbrok e John abraçam Jeremias.)
JOHN - Meu amigo!
BOLINGBROK - Minha amigo! (Ao mesmo tempo.)
JEREMIAS - Não me afoguem!
NARCISO - Vou me queixar ao Ministro inglês, vou me queixar ao Governo desta imposição inglesa. (Para Serapião e Pantaleão:) Vamos, amigos!
VIRGÍNIA, correndo para ele, e lançando-se-lhe aos pés - Meu pai!
CLARISSE, no mesmo, ao mesmo tempo - Meu pai!
NARCISO - O que é lá isso?
VIRGÍNIA - John ainda me ama.
CLARISSE, ao mesmo tempo tempo - Bolingbrok ainda me ama.
JOHN e BOLINGBROK - Yes!
CLARISSE - E estará pronto a sujeitar-se a todas as cerimônias religiosas que tornem o nosso casamento legítimo.
JOHN - Eu estou pronto para tudo.
BOLINGBROK - Yes, pronta.
JEREMIAS - Meu caro senhor Narciso, a isto não se pode o senhor se opor; elas querem... (Bolingbrok e John abraçam Jeremias.)
CLARISSE e VIRGÍNIA - Meu pai, eu ainda o amo.
NARCISO - Levantai-vos. (As duas levantam-se.) Bem sei que sem o vosso consentimento não poderei anular o casamento. Senhores, depois que estiverdes legitimamente casados, poderei levar vossas mulheres.
JOHN, abraçando Virgínia - Minha Virgínia!
BOLINGBROK, abraçando Clarisse, ao mesmo tempo - My Clarisse!
NARCISO, para Serapião e Pantaleão - Perdoai-me, meus amigos.
JOHN - Jeremias será nosso sociado.
BOLINGBROK - Yes, será nosso sociado!
JEREMIAS - Oh, eu vou fazer fortuna, minha Henriqueta! (Abraça-a.)
HENRIQUETA - Iremos para a Bahia e seremos todos...
JOHN, BOLINGBROK, VIRGÍNIA, CLARISSE, JEREMIAS e HENRIQUETA - Felizes!
NARCISO, SERAPIÃO e PANTALEÃO, ao mesmo tempo - Logrados!