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As Doutoras/II/XVI

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Personagens: OS MESMOS e CARLOTA DE AGUIAR

CARLOTA (Entrando.) — Entrei sub-repticiamente sem me fazer anunciar.

PRAXEDES — Ora, seja bem-vinda, Doutora!

CARLOTA (Inclinando-se diante de Maria.) — Minha senhora, a curvatura de meus respeitos.

PRAXEDES — Sinceros parabéns pelos triunfos alcançados ante­ontem no júri. Li em todos os jornais a notícia da sua brilhante defesa.

CARLOTA — Foi um debate homérico; com réplica e tréplica, em que derroquei à luz da aurora bruxuleante do Direito moderno, os castelos carcomidos da vetusta legislação, crivados de teorias incongruentes e obsoletas.

PRAXEDES — E tratava-se de um caso completamente novo.

CARLOTA — A esposa que surpreende o marido com a amante e que resolve a situação trucidando os dois. Mas deixemos o júri, a minha defesa, os meus triunfos. O que me traz aqui é um motivo de ordem grandíloqua, elevada e arquicivilizadora. Senhor Manuel Praxedes, apresento-me candidato à Deputação Geral, pelo Município Neutro.

PRAXEDES — Bravo! Bravo! Muito bem!

MARIA — Pois as senhoras querem também ser deputadas?

PRAXEDES — Por que não? Nos Estados Unidos, as mulheres são caixeiras, empregadas nos telégrafos, nas estradas de ferro, nos correios... são até capitães de navios.

CARLOTA — Até bombeiras. Amanhã sairá em todas as folhas a minha circular. Nesta peça estereotipo o programa das reformas sociológicas femininas de que pretendo dotar o meu país. Vai ver, fica a mulher equiparada ao homem em tudo por tudo. É uma revolução.

PRAXEDES — Creio bem!

CARLOTA — O Brasil está atrasadíssimo na ciência do Direito. Basta considerar que esta ciência não corresponde às aspirações grandíloquas condóricas se é que posso exprimir-me assim...

PRAXEDES — Perfeitamente.

CARLOTA — Do nosso progresso material. O telefone invade tudo, o telefone leva o pensamento às mais longínquas distâncias e entretanto ainda não temos o Direito Telegramático, a Jurispru­dência Telefonética.

PRAXEDES — O telefone podia ter acabado com as precatórias...

CARLOTA — Justo. Entrou perfeitamente no âmago do meu pensamento.

PRAXEDES — Quando houvesse necessidade de deprecar de um juízo para outro, para uma avaliação por exemplo...

CARLOTA — O juiz a quo ia ao telefone, o ad quem ouvia...

PRAXEDES — Procedia à avaliação...

CARLOTA — E gritava pelo telefone: está cumprida a diligência. Quanta economia de tempo...

PRAXEDES — E de papel!...

CARLOTA — Apoiado! (Tirando do bolso cartões e entregando a Praxedes.) Aqui tem para distribuir pelos seus amigos. (O mesmo a Maria.) Peço-lhe, minha senhora, que advogue também a minha causa; vai nela hasteada a flâmula da emancipação feminina, que hei de defender até a morte com o gládio incandescente do meu humilde verbo!

PRAXEDES (Lendo os cartões.) — "Para Deputado Geral pelo Primeiro Distrito da Corte: Bacharela Carlota Sinfrônia de Aguiar, advogada. — Telefone 2028." (A Carlota.) Muito bem!