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Através do Brasil/LXVIII

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LXVII. O PREPARO DO CAFÉ

Com a fadiga natural da longa viagem, Alfredo adormecera; mas o irmão, Carlos, continuou atento. Aproveitando um momento em que o caixeiro suspendeu um pouco a conversa, perguntou-lhe:

— Mas, Sr. Rogério, como pode o senhor, que mora no Rio de Janeiro, conhecer tão bem assim a lavoura do café?

— É que tenho viajado por toda esta região, e já passei muitos dias em fazendas, tanto na época da plantação como na das colheitas... Em maio, entra a estiagem, os cafés estão maduros, começa a colheita. Um enxame de colonos segue para os cafezais. Com uma peneira presa à cintura, um samburá a tiracolo, panos e escadas para os cafezais mais altos, lá vão eles: são famílias inteiras — homens, mulheres e crianças. Cada grupo de trabalhadores segue por uma rua, de arbusto em arbusto, correndo as mãos pelos ramos, e despejando para o samburá os punhados de cerejas e de folhas. A planta fica nua, as varetas finas tremem ao vento, como ramalho seco, e a plantação parece, depois da colheita, uma roça devastada pelas formigas, ou assolada pelos gafanhotos. Não se pode colher de fruto em fruto; raspa-se todo o ramo, e, com um só movimento, apanha-se uma mão cheia.

“O serviço é áspero; a haste nodosa do cafeeiro dilacera as mãos ainda não habituadas e calejadas. Colhida uma certa porção, leva-se à peneira; retiram-se as folhas que ficam em cima, e vão os frutos para os montes. Cada apanhador de café tem o seu pano, espécie de lençol, que se estende em baixo do arbusto, e onde cai grande número de frutos; antes de passar adiante, ergue-se o pano, e recolhem-se todas as bagas que sobre ele caíram. Cada trabalhador leva para as grandes ruas do cafezal, para os caminhos de carro, — o seu café, e aí o entrega, medido. Fazem-se grandes montes de café em cereja, isto é, do fruto maduro, colhido e fresco, ainda rubro ou alaranjado como a cereja madura. Dois, três, quatro dias passa aí o fruto, e os carros de bois o vão conduzindo para os terreiros de café, ao pé do engenho.

“Esse terreiro é uma vasta esplanada, de chão nivelado, horizontal, cimentado, ou batido, de centenas de metros quadrados de superfície, e sobre o qual o café é espalhado para secar. Em face, fica o engenho; e, logo junto, o paiol, as tulhas.

“Espalham-se as carradas de cereja sobre o terreiro, e aí fica o fruto, até secar completamente a casca, que toma o aspecto de um pequeno coco, ou de uma pequena avelã, comprida e quase negra. Dentro, chocalha o grão do café. É o café em coco. Para que ele chegue a esse estado, é preciso ficar por muitos dias exposto ao sol e ao ar livre. Para isso, espalham-no sobre o terreiro, em camadas muito finas, de menos de uma polegada: duas, três vezes por dia é revolvido; de espaço a espaço, abre-se a camada de café, e formam-se leiras estiradas, deixando a nu compridas faixas do chão do terreiro, para que receba o sol diretamente, e para que este enxugue toda a umidade.

“Seco o fruto, o café em coco é lavado. Lavam-no em grandes tanques anexos ao terreiro, tanques dispostos em declive, tendo em baixo uma grade bastante fina para que o coquilho não passe. Despeja-se o fruto, e sobre ele cai o forte jorro de água, que o desembaraça de todos os elementos estranhos: os gravetos, as folhas, os grãos apodrecidos; tudo isso vem à tona da água, e escapa-se pelos escoadouros dos tanques. As terras, as pedrinhas mais pesadas vão para o fundo. O café puro, lavado, é ainda uma vez estendido no terreiro limpo; e seco de novo, está pronto para entrar no engenho, onde será beneficiado; isto é: entra para as máquinas, que o descascam por completo, e separam os grãos, pelo tamanho, pelo formato. Estas máquinas são: os descascadores, os ventiladores, os catadores. O café sai do maquinismo para o saco. A maior parte das grandes fazendas já têm também despolpados — máquinas que desembaraçam o fruto, apenas murcho, da casca carnosa, evitando-se deste modo o longo período do trabalho no terreiro, e obtendo-se um produto melhor.