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Dicionário de Cultura Básica/Mario

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MARIO de Andrade (poeta brasileiro) → Modernismo

A arte, mesmo a mais pessimista,
é uma proposição de felicidade.

Mário de Andrade (1909–1945), paulistano e amigo de Oswald de Andrade apesar de algumas controvérsias estéticas, é o grande teórico do movimento modernista No "Prefácio Interessantíssimo" à coletânea de poemas Paulicéia desvairada, divulga alguns princípios artísticos do Surrealismo francês, especialmente a moda da escrita automática: o poeta deve deixar-se levar pela força do subconsciente. Dois anos depois da famosa "Semana da Arte Moderna", em 1924, publica outro ensaio teórico, intitulado A escrava que não é Isaura ("discurso sobre algumas tendências da poesia modernista"), em que apresenta a fórmula completa da sua poética: as forças anárquicas do inconsciente devem ser buriladas pela ação da inteligência e expressas por uma linguagem livre de constrangimentos gramaticais e sintáticos e de qualquer tipo de esquemas estróficos e rímicos. Mas a grande contribuição de Mário de Andrade à poesia modernista brasileira são suas pesquisas sobre música e folclore. Professor de piano e apreciador e crítico de várias artes, sua sensibilidade leva-o a diferenciar a harmonia da melodia. Esta, que estaria na base da lírica tradicional, se preocupa em encontrar correspondências entre sons e sentidos; aquela, deixando as palavras em liberdade, como queria Marinetti (→ Futurismo), seria obtida pelo chamamento à distância, pela sobreposição, pela polifonia. Quanto ao folclore, além do estudo de várias formas de cultura indígena, Mário pesquisa também a "fauna" humana brasileira, especialmente a paulista, formada pelo cruzamento de várias etnias:

Mulher mais longa
que os pasmos alucinados
das torres de São Bento.
Mulher feita de asfalto e de lama de várzea,
toda insulto nos olhos,
toda convites nessa boca louca de rubores!
Costureirinha de São Paulo,
ítalo-franco-luso-brasileiro-saxônica,
gosto dos teus ardores crepusculares
crepusculares e por isso mais ardentes,
bandeirantemente!

O poema acima é um dos escritos em 1920, que só ousou publicar em 1922, após a euforia da Semana, na coletânea citada. É que Mário de Andrade era tido pelos intelectuais conservadores da época como um poeta escandaloso, imoral, "futurista". A faceta revolucionária do grande escritor paulista explode decisivamente na sua participação no congresso dos modernistas no Teatro Municipal. Ele ataca violentamente a burguesia acomodada, moralmente hipócrita, insensível ao sofrimento da massa popular:

Eu insulto o burguês! O burguês-níquel
O burguês-burguês!
A digestão bem feita de São Paulo!
O homem-curva! o homem-nádegas!
O homem que sendo francês, brasileiro, italiano
é sempre um cauteloso pouco a pouco!...
Ódio e insulto! Ódio e raiva! Ódio e mais ódio!
Morte ao burguês de joelhos,
cheirando religião e que não crê em Deus!
Ódio vermelho! Ódio fecundo! Ódio cíclico!
Ódio fundamento, sem perdão!
Fora! Fu! Fora o burguês...

Outras coletâneas de poemas de Mário de Andrade: Há uma gota de sangue em cada poema (ainda da fase parnasiana); Losango cáqui (um pot-pourri lírico de brincadeiras, reflexões, sensações); Remate de males e Clã do jabuti (poemas de temas folclóricos); Lira paulistana; Poesias completas.