Ecos da minh'alma/A aurora brasileira
Quando tu, luso cantor,
Na tua lyra dourada
Modulaste com primor
Uma linda — madrugada,
Porque dizer não quizeste,
Que a aurora que descreveste
No teu hymno tão gentil,
E esse mar de lisa prata,
Que os arvoredos retrata,
Eram só do meu Brasil?
Porque dizer não havias,
Que esse nascer prazenteiro
De puros, formosos dias,
Era do céu brasileiro?
D’este céu abençoado,
De bello anil esmaltado
Pela mão do Creador;
Que ledo nos apresenta
Na formosura que ostenta,
Um milagre do Senhor?!
Que tem noites tão formosas
De prateado luar?!
Que possue manhãs de rosas,
E tardes.... de arrebatar?!
Tu, por acaso, ignoravas
Que a madrugada pintavas
Da minha terra natal?
Ou, — cégo do patrio amor, —
Julgaste que esse primor
Era do teu Portugal?
Vem, no céu do meu paiz,
Ver bella aurora de estio
Como se mostra feliz,
Como se mira no rio!
Vem vêl-a, mimosa abrindo
O transparente véu lindo,
Viçosas flôres soltar,
E dos olhos lacrimantes
Mil per'las, mil diamantes
Sobre todas derramar!
Vem ver das tranças formosas,
Por leve brisa onduladas,
Descerem candidas rosas,
Violêtas delicadas!
Jamais nesse Portugal
O teu sonho divinal
Realisado gozaste...
Vem; porque só minha terra
As maravilhas encerra
Do quadro, que debuxaste.
Vem ouvir o harmonioso,
O doce canto aflautado
Do sabiá mavioso,
Sobre o raminho pousado.
Vem ver os volateis todos
Festejarem de mil modos,
Com folguêdos e cantares,
A fagueira madrugada,
Que, de flôres adornada,
Perfuma os limpidos ares.
Vem contemplar a lindeza
D’este Brasil tão jucundo;
Vem ver sua natureza,
Que é a mais bella do mundo;
Vem ver seu sol descoberto,
'Num céu de nuvens deserto,
Deslumbrante de fulgores;
Vem aqui ver como o Eterno,
Até nos dias de inverno,
Veste o campo de verdores!
Diz-me, vate lusitano,
O céu do Portugal teu
E como o americano
Anilado, puro céu?
Diz-me, si na plaga tua
É tão diáphana a lua,
Si é tão meiga, tão gentil?
Si brilha em noites tão bellas,
Tão opulentas de estrellas,
Como as do rico Brasil?
Si o seu raio illuminado,
Por sobre um mar transparente,
Pelas aguas embalado
Se estende tão docemente?
Si doura o cume dos montes;
Si beija o crystal das fontes
Com tanto enlevo e doçura;
Si do templo na vidraça
Reflecte com tanta graça
A face de luz tão pura?
Tens nos prados tanto viço?
Nos fructos tanto sabor?
Na vida tanto feitiço?...
No coração tanto amor?...
Vem, ó Bardo, vem asinha
Na mimosa patria minha
A tu'alma extasiar;
'N este clima brasileiro,
Vem sob um céu prazenteiro
Nova existencia gozar.
Oh! vem, sublime Poeta,
Ver o meu solo natal;
Que de Deus a mais dilecta
É a terra de Cabral!
Vem da minha terra amada
Ver a linda madrugada,
Ver do céu a perfeição!
Vem contemplar uma lua,
Que sabe, mais do que a tua,
Responder ao coração!