Fausto (traduzido por Agostinho de Ornelas)/XV
Perdido tenho o socego,
Magoado o coração;
Fugiu a paz da minh'alma,
Não a torno à achar mais, não.
Logar onde o não encontre
Triste é qual sepultura,
O mundo todo parece
Repassado de amargura.
A cabeça desvairada
Tenho, e turvo o pensamento.
Saudades, ai, que endoudecem,
São meu continuo tormento.
Perdido tenho o socego,
Magoado o coração;
Fugiu a paz da minh'alma,
Mais não torno a achal-a, não.
Quando á janella me chego,
Querem meus olhos buscal-o;
E quando sáio de casa,
É: sómente p'ra encontral-o.
O seu ar é magestoso,
É gentil sua estatura.
Que fogo altivo nos olhos,
No sorriso que doçura!
E se dos labios lhe correm
Doces fallas de encantar,
Quando a mão elle me aperta,
Quando me chega a beijar!
Perdido tenho o socego,
Magoado o coração;
Fugiu a paz da minh'alma,
Não a torno a achar mais, não.
A elle meu peito aspira
Todo em amor abrazado,
Oh quem me dera aqui tel-o
Nestes braços apertado.
E tanto tempo beijal-o
Que me podesse fartar,
Ainda que de seus beijos
Eu houvesse de expirar.