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Galeria dos Brasileiros Ilustres/Marquês de Valença

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Estêvão Ribeiro de Resende, filho legítimo do coronel Severino Ribeiro, de distinta família de Lisboa, e de D. Josefa Maria de Resende, de abastada e importante família de Minas Gerais, nasceu no arraial dos Prados, Comarca do Rio da Morte, província de Minas, em 20 de julho de 1777.

Educado desde seus primeiros anos com todo o esmero e cuidado que sóem ter por seus filhos os pais que, como os seus, prezam mais que tudo a honra e a virtude, nunca se mostrou indigno do nome que recebeu de sua família, e pelo contrário mereceu sempre, por suas boas qualidades e morigeração, a estima de todas as pessoas que o conheceram apenas entrado no mundo, mas já pensando com um critério pouco comum em sua idade sobre as coisas da vida.

Tendo mostrado muita viveza para os estudos primários, aproveitou suas disposições para as letras e mandou-o estudar em Minas os preparatórios, que ali então se ensinavam. Em breve, pois, ficou o jovem Estêvão Ribeiro de Resende pronto para exame em francês, latim, italiano, retórica e filosofia, estudos em que muito se distinguiu, e tanto que seu pai logo que o teve neles preparado mandou-o para Lisboa a seguir para Coimbra, onde devia estudar o curso de direito.

Separado de seus pais e do lugar de seu nascimento, onde deixava tanta simpatia, que quase toda a população de S. José do Norte despediu-se dele com as provas do mais vivo pesar, caprichou o Sr. Resende por continuar longe de sua família a mesma norma de conduta que sempre seguira quando em seu seio; e com efeito, em Coimbra com-portou-se por tal modo, que em breve foi muito estimado por seus colegas e benquisto de seus professores.

Sua inteligência não desmentiu nos novos estudos a que se aplicou, os primeiros sinais de força e agudeza que dera em seus estudos primários e secundários; seu curso ele o completou sem nenhum embaraço, antes pelo contrário, recebendo sempre boas notas e muita consideração, o que lhe facilitou ser aceito para a leitura do Desembargo do Paço, primeira porta por onde então se entrava para a carreira da magistratura. Antes, porém, que fizesse a leitura, morreu-lhe no Brasil seu pai, e essa notícia chegando-lhe a Lisboa naquele tempo, quis ele interromper sua carreira para vir à pátria beijar as mãos à mãe e apresentar-se-lhe depois de doutorado.

De volta a Portugal fez sua leitura no Desembargo do Paço, e foi logo nomeado pelo Senhor D. João VI, em 21 de junho de 1806, juiz de fora de Palmela, tendo já antes recebido do mesmo monarca o hábito de Cristo com uma tença e a propriedade do ofício de tabelião do público judicial e notas da vila de S. João del-Rei, em atenção aos bons serviços de seu pai e às suas qualidades, mais que dignas daquela distinção.

Pouco depois de empossado no juizado de Palmela, em Portugal, teve lugar na península a invasão francesa, que vinha com o prestígio de mil vitórias conquistadas para o irmão do vencedor do mundo uma coroa e um estado.

A corte portuguesa, colocada na alternativa que lhe ofereciam, de um lado a França arrogante e orgulhosa de seus triunfos, e do outro a Inglaterra forte e sempre pertinaz em não ceder às águias imperiais, a Europa e o mundo a que se atiravam com avidez, resolveu sabiamente escolher um meio-termo, deixando a antiga metrópole para vir estabele-cer-se no Brasil; o juiz de Palmela quis aproveitar essa oportunidade de voltar à sua pátria e à sua família, e por isto muito se empenhou para fazer parte da comitiva real; porém sendo preciso, para bem do Reino, que as autoridades permanecessem em seus postos e manifestando o governo regencial a utilidade que resultava deste fato, o Sr. Resende desistiu de seus desejos, e ficou em Palmela, onde recebeu com ânimo e coragem as tropas franco-espanholas que acometiam o reino de Portugal.

Esta foi talvez uma das épocas em que o Sr. Resende maiores serviços prestou à sua pátria. No ponto em que se achava não se teve com efeito que lastimar grandes males que deixavam a consternação e a desolação por onde passavam as tropas invasoras. A honra e a fortuna foram respeitadas em Palmela por esforço de seu juiz, que, revestindo-se de toda a coragem e energia, dirigia-se a fazer reclamações e censura, onde e sempre que se dava um fato de abuso de força da parte das forças ali estacionadas.

Por algum tempo marcharam as coisas assim de um modo o mais satisfatório, mas nem era crível, nem mesmo imaginável, que soldados acostumados a derrubarem todas as barreiras, quer físicas, quer morais, viessem aqui estacar defronte de um só homem, embora por esse homem falassem a razão e a justiça. O vencido não tem direitos, sua lei é a vontade do vencedor, e pois o que fazer o juiz de fora de Palmela quando os franceses, fechando os ouvidos à sua voz, quiseram obrigá-lo, e obrigaram o povo que lhe tinha sido confiado a concorrer com o necessário para sua subsistência e para a satisfação de seus caprichos? Enquanto foi possível resistir-lhe, ele o fez, agora, porém, que sua influência é nula e que sua pessoa atrai sobre os que o seguem ódios e maus desejos, agora que sem dúvida com perigo iminente sem que daí resulte bem para ninguém, agora é tempo de ceder à força das circunstâncias. E com efeito, o Sr. Resende deixou Palmela e retirou-se para Lisboa, tendo antes em companhia de um vereador ocultado em um altar os dinheiros públicos que tinha à sua disposição.

Recebendo d’el-rei a faculdade de voltar para o Brasil, ele o fez imediatamente, e ao chegar em sua pátria natal, viu apreciado por seu devido valor os serviços que acabava de prestar, e em atenção aos anuais o Senhor D. João VI nomeou-o em 13 de maio de 1810 juiz de fora da cidade de S. Paulo, lugar que foi ele encarregado de criar naquela cidade.

Em 17 de dezembro de 1813 deixou ele o juizado de S. Paulo, por ter nessa mesma data sido nomeado fiscal dos diamantes, lugar importante que teve de deixar no ano seguinte, em conseqüência de ter sido nomeado em 12 de setembro de 1814 desembargador da relação da Bahia.

Em toda a parte por onde passava o Sr. Resende era geralmente estimado e apreciado por suas qualidades, e cada um lugar que exercia dava-lhe novos títulos e mais direitos para alcançar lugares mais subidos.

Felizmente naqueles tempos as qualidades e aptidão davam direito; e é por isto que o novo desembargador da Bahia foi a 29 de março de 1817, quadra calamitosa de revoluções, nomeado ajudante do inten-dente-geral da polícia, e no seguinte ano de 1818, a 12 de outubro, nomeado desembargador da Casa da Suplicação.

A 10 de novembro de 1821 foi nomeado superintendente-geral dos contrabandos, e nessa época em que o Brasil tanto precisou do esforço de seus filhos, Estêvão Ribeiro de Resende esteve firme na estacada, prestando a seus pais e a seu príncipe os serviços que podia prestar.

Procurador da província de Minas Gerais, junto ao príncipe D. Pedro, ele mostrou-se tal qual era e captou por esse modo a estima daquele príncipe, que sempre distinguiu e que elevou-o ao ponto de nomeá-lo, a 6 de abril de 1822, secretário de estado encarregado de todas as pastas para acompanhá-lo a Minas, onde uma nobre inspiração o levava com o fim de acalmar com sua presença os movimentos sediciosos que ali começavam a manifestar-se, a ponto de negar-se aquela província a obedecer ao príncipe regente.

Veio a Independência, e logo após a necessidade de regular-se o pacto fundamental por onde devesse o país se regular; o imperador convoca para esse fim a Assembléia Constituinte; e Minas, que atende para o merecimento quando escolhe um alto funcionário, tanto quanto um qualquer empregado, elege seu deputado ao Sr. Resende. Cai a Constituinte em virtude do golpe de estado do primeiro imperador, tudo se amotina, parece que vamos ter uma revolução, mas graças à boa escolha do Senhor D. Pedro I, mandando, a 17 de janeiro de 1823, ao Sr. Resende para intendente-geral da polícia, toda a tempestade se desfaz sem deixar o mais ligeiro sinal de sua aterradora passagem, e nem por isto foi necessário o emprego de armas e ameaças de prisões e perseguições, bastou a influência e a confiança geral de que gozava o intendente para obter aquele resultado.

Em 14 de outubro de 1824 chamou-o o Senhor D. Pedro I aos Conselhos da Coroa, encarregando-o da pasta do Império, que teve a seu cargo até 21 de novembro de 1825, em que recebeu o decreto de sua demissão, no qual elogiava muito o imperador e lhe agradecia seus bons serviços. Naquele mesmo ano de 1824 foi ainda nomeado, a 1º de dezembro, desembargador honorário do paço, e em 15 de outubro de 1825 foi galardoado por Sua Majestade o Imperador com o título e grandezas de barão de Valença.

Neste ano veio o Sr. Resende eleito por sua província à as-sembléia geral legislativa, e ao mesmo tempo que tinha por essa honrosa eleição entrada na Câmara dos Deputados, recebia ainda de seus com-provincianos maior honra e maior prova de estima e consideração, tendo seu nome na lista por eles oferecida ao Monarca para escolher os senadores do Império. Conjuntamente com Minas Gerais, quis S. Paulo mostrar toda a sua afeição e agradecimento pelo distinto brasileiro, que em seu solo começou a carreira da magistratura em que tantas glórias colheu, escolhendo seu nome para mandar ao Imperador na lista dos que deviam ser escolhidos seus senadores. Assim, pois, era o Sr. Valença ao mesmo tempo deputado por Minas, e eleito senador pela mesma província e pela de S. Paulo. Entre as duas províncias optou pela de Minas, onde tinha seu berço e tudo o que há de mais caro ao coração do homem, sua família e as cinzas de seus bons pais. Em vista de sua opção, foi escolhido senador por carta imperial de 19 de abril de 1826 e nesse mesmo ano, a 12 de outubro, passou a desembargador do Paço efetivo e foi aposentado por pedido seu; assim como também a 30 do mesmo mês e ano foi o seu título de barão elevado ao de conde de Valença.

A 18 de maio de 1827 entrou novamente o então conde de Valença para os Conselhos da Coroa, e desta vez coube-lhe a pasta da Justiça, em que funcionou até 20 de novembro de 1827, em que foi dissolvido o gabinete de que fazia parte e com o qual também ele caiu, tendo sido três dias antes nomeado conselheiro de estado honorário.

Retirado de cena política, ficou o conde de Valença exclusivamente ocupado com os deveres de senador do Império, e foi desse posto eminente que ele agregou em torno de si esse grupo de seus colegas, que fizeram a mais heróica barreira aos excessos demagógicos que se desenvolveram no Brasil pela retirada do fundador do Império.

Firme nesse posto, que a honra e o dever lhe haviam indicado, o conde de Valença não descansou um momento enquanto não viu por terra a demagogia e elevado ao trono do Brasil o filho do seu primeiro imperador. Então faltaram-lhe forças para novas lutas; já tinha 63 anos, já tinha combatido com uma geração inteira, nova geração despontava nos horizontes da pátria, era força ceder-lhe os negócios dessa cara pátria. O Sr. Valença retirou-se completamente da vida política para entregar-se exclusivamente à vida privada.

Em 1848 o Senhor D. Pedro II elevou-o a marquês de Valença, e em 8 de setembro de 1856 veio a morte surpreendê-lo no seio de sua família, e na idade de 79 anos.

O marquês de Valença foi casado com a Exmª Srª Elídia Mafalda de Sousa Queirós, filha do opulento fazendeiro brigadeiro Luís Antônio de Sousa e sua mulher D. Genebra de Barros Leite.

Era sócio honorário do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro, sócio efetivo da Sociedade Auxiliadora da Indústria Nacional, sócio efetivo da Instrução Elementar, membro da Sociedade de Agricultura do Reino da Suécia, dignitário honorário da ordem imperial do Cruzeiro por carta de 16 de agosto de 1830, cavalheiro do hábito de Cristo, grã-cruz da mesma ordem e fidalgo cavalheiro da casa imperial.