Galeria dos Brasileiros Ilustres/Visconde de Itaboraí
A 13 de dezembro de 1802 nasceu no Porto de Caxias, freguesia de Itaboraí, província do Rio de Janeiro, o Sr. Joaquim José Rodrigues Torres, depois visconde de Itaboraí.
Foram seus pais o Sr. Manuel Rodrigues Torres, já falecido, e D. Emerenciana Matilde Torres, os quais não pouparam cuidados e meios de educá-lo nos sãos princípios da mais severa moral, cujo influxo ainda hoje se exerce e manifesta-se em todos os atos e na vida inteira do Sr. de Itaboraí em quem nenhuma ação conhecida jamais marcou o brilho do nome de honesto e honrado que adquiriu entre seus concidadãos e que ninguém poderá recusar-lho.
É que do mesmo modo por que as primeiras idéias e as impressões da infância são as que mais se gravam na memória dos homens, e aí permanecem sempre vivas, assim também os primeiros princípios de educação que recebemos de nossos pais são os que hão de em todo o tempo servir de norma a nossas ações e a todos os atos de nossa vida. Feliz quem teve pais zelosos que não esqueceram, ou não abandonaram a educação de seus filhos, e que lhes deram desde o berço o germe e a base de toda a felicidade na Terra: uma consciência apurada, e uma alma propensa para o bem tanto quanto instruída nas sendas da honra e da virtude.
Nesse ponto o Sr. visconde de Itaboraí não tem que invejar a pessoa alguma, e a prova a mais palpitante do quanto seus pais se esmeraram por sua educação está na vida mesma desse cavalheiro.
Não foi porém somente o moral de seu filho que os pais do Sr. de Itaboraí quiseram e procuraram por todo o modo desenvolver e aperfeiçoar; o lado intelectual não lhes mereceu menos cuidado, porque bem viam eles que as luzes da inteligência são a primeira condição e condição essencial de todo o progresso e desenvolvimento humanitário.
Assim, pois, ao mesmo tempo que seus exemplos e conselhos lhe ensinaram o caminho da honra, confiando-o a bons mestres que lhe iluminassem o espírito, procuraram ensinar-lhe também o caminho da glória.
Foi por isto que, ainda em mui tenra idade e depois de ter o Sr. Rodrigues Torres os seus estudos primários, mandou-o seu pai estudar preparatórios no Seminário de S. José, donde saiu habilitado para matricular-se na Universidade de Coimbra a que se destinava, e para onde partiu em 1821 com o fim de estudar matemática, que com efeito estudou e em que saiu formado no ano de 1825.
Como estudante logrou o Sr. Torres adquirir uma reputação que, apesar de criada tão longe de seu país natal, não deixou por isto de chegar até aí, tanto que vindo ele para o Brasil em 1826, foi nesse mesmo ano nomeado lente substituto da Academia Militar, o que não foi certamente pequena honra nem pequena prova de inteligência para um moço de 23 anos de idade que apenas tendo deixado os bancos de estudante não teve por isso mesmo tempo nem ocasião de se fazer conhecido por outros trabalhos que não fossem os escolares.
Nesse lugar serviu o Sr. Torres desde 1826 até 1833 em que pediu sua demissão, não sem dúvida porque lhe faltassem as qualidades necessárias para o magistério, mas talvez porque não visse naquela carreira o futuro que aspirava, e divisasse pelo contrário ao longe e em outras direções mais belos horizontes.
Seja como for, é para lamentar que o Sr. Rodrigues Torres não sacrificasse um pouco do interesse que o levou a dar aquele passo, pelo amor da mocidade brasileira, que não tinha naquele tempo, como tem hoje, muitos lentes que a animassem e a ilustrassem com seus conhecimentos; e tanto mais é isto para sentir-se quanto o Sr. Torres, além do muito aproveitado tempo que levara na Universidade de Coimbra, tinha ainda voltado à Europa em 1827 e aplicado-se em Paris até 1829, sem dúvida a estudos de sua profissão.
Regressando pela segunda vez ao Brasil, começou o Sr. Torres a aparecer muito vantajosamente na cena política, a ponto de ser em 1831 chamado à pasta da Marinha pela regência de Lima e Silva, Bráulio Muniz e Costa Carvalho.
Apesar de começar sua carreira administrativa sob os piores auspícios, pois que, como bem se sabe, naquele tempo calamitoso, os motins e sedições surgiam a cada instante uns das ruínas dos outros, e isto não somente na corte, mas ainda nas províncias e especialmente nas do Norte que tiveram cada uma das suas sublevação particular; apesar de todos esses embaraços, dizemos embaraços poderosos para um moço que pela primeira vez toma as rédeas do poder, o Sr. Rodrigues Torres saiu-se bem e retirou-se do Ministério conceituado e prestigioso, de modo que logo depois em 1832 foi novamente chamado para a pasta que deixara; persistindo ainda toda agitação geral do Império, e especialmente das províncias do Pará, que mesmo em 1832 proclamou-se independente; de Pernambuco, que teve a guerra terrível dos Cabanos ou de Panelas de Miranda e Ceará, a braços em a de Pinto Madeira, que havia começado em 14 de dezembro de 1831 e que terminou em 13 de outubro de 1832, entregando Pinto Madeira as armas ao general Labatut, comandante das forças da legalidade.
No meio de todos esses abismos que se abriam diante dos passos dos regentes e que empeciam a marcha regular de seu governo, ainda não naufragou a boa reputação e conceito em que era tido o ministro da Marinha; ao contrário, a habilidade com que por sua parte concorreu para que o governo do país se sustentasse firme no posto que a maioria da nação lhe havia confiado o fez ainda mais estimado e tornou-o muito popular, especialmente na província do Rio de Janeiro, da qual teve em 1833 a honrosa missão de representá-la na Câmara dos Deputados. Foi a primeira vez que o Sr. Rodrigues Torres se apresentou na tribuna dos representantes do país, mas já antes disto todo ele conhecia os talentos oratórios do novo deputado, que como ministro mais de uma vez tinha levantado a voz no seio de ambas as câmaras.
Como deputado o Sr. Rodrigues Torres distinguiu-se menos por orador eloqüente, que o não é, do que por argumentador fino e consumado. Enuncia facilmente suas idéias, sua linguagem é precisa e limada e seus argumentos de uma lógica cerrada, dificílima de desfazer. É um desses homens que convence, mas que não comove, que sabe falar à razão, mas que ignora os meios de tocar o coração.
Por todas estas qualidades ele ocupou logo na Câmara uma posição eminente, e abraçando as idéias saquaremas tornou-se um dos mais eminentes dentre seus chefes.
Esta influência que ele exerceu como deputado, que continuou sempre a ter até 1844, estendeu-se além deste ano em que foi ele eleito senador pela província do Rio de Janeiro, e só a conciliação emanada do trono e executada pelo Gabinete Paraná pôde, fazendo desaparecer a divisão política, fazer também desaparecer de um e de outro lado aqueles indivíduos que mais se elevam acimados dos outros em cujo número está o Sr. Torres.
Em 1837 o regente Feijó quis aproveitar-se de sua prática adquirida no Ministério da Marinha, nomeando-o para aquela pasta.
Em 1840 foi o Sr. Torres deslocado de sua repartição favorita, sendo chamado a ocupar a pasta do Império e interinamente e da Marinha, muito tempo porém não durou neste ministério, e, quando em 1843 o Sr. D. Pedro II o chamou outra vez ao ministério, voltou já pela quarta vez a dirigir os negócios tão atrasados da repartição da Marinha.
Este ministério deixou ele para subir novamente ao poder em 1849 como ministro dos Negócios da Fazenda, que continuou a ser até 1853, em que caiu aquele Ministério, justa ou injustamente acusado de ter muito durado e pouco feito pelo país.
Por sua parte o Sr. Itaboraí prestou ao Brasil um serviço importantíssimo fazendo passar nas câmaras o projeto de criação do Banco do Brasil, de que veio ser presidente, pelo falecimento do conselheiro Lisboa Serra.
Em 1841 teve o título do conselho e a condecoração de Oficial da Ordem Imperial do Cruzeiro, e em setembro de 1853 foi nomeado conselheiro de Estado.
No dia 2 de dezembro de 1854 S. M. Imperial o Sr. D. Pedro II concedeu-lhe o título que hoje tem de visconde de Itaboraí.