Horas de Folga/O dentista
José, sentado no chão,
Disse á irmã, muito contente:
– Empresta me essa boneca
Para lhe tirar um dente.
E’ preciso que ella aprenda
Tambem a poder sofrer.
Rir e cantar é melhor;
Mas é bom tudo saber.
E com ar de muita pompa,
Num alicate pegando,
Arranca a bôca á boneca,
O que a irmã vê chorando.
Satisfeito com tal obra,
Diz José, vendo-a gritar:
– E’ justo, mulher, é justo,
Mas vou-lhe a filha curar.
Nini e a sua boneca
Tirando do bolso um lenço,
Atou á boneca o rosto
Emquanto Nini soluça
No auge do seu desgosto.
A mãe, que tinha saído,
Acabava de chegar
Quando ouviu, subindo a escada,
Nini estar a soluçar.
Correu logo muito aflita
E, vendo o que tinha sido,
Quiz castigar o dentista,
Mas já se tinha evadido.
Nesse dia, á sobremesa,
José está vendo comer
Emquanto Nini murmura:
– Eu cómo e ficas a vêr!…
Então a mãe, intervindo,
Diz a Nini com pesar:
– Gozáste co’o mal alheio,
Não podes continuar.
Dá ao gato o teu pudim.
Podem-se ambos levantar.
Quem pratica o que não deve
Tem por força de o pagar.