Horto (1910)/Symbolicas
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A Emilia Guerra.
Quando Deus creou Alem
As estrellas em cardume,
Na Terra creou tambem
As flores, mas sem perfume.
Um dia, ao mundo de abrolhos
A Virgem pura desceu,
Com um manto da côr dos olhos
E uns olhos da côr do Céo.
No Céo azul de seu manto
Brilhava um astro: Jesus!
E, em seu olhar sacrosanto,
Boiava a Innocencia, a Luz...
Maria! — os anjos clamaram
A chorar, vendo-a partindo... —
Tu levas nossa alegria...»
Mas da Terra lhe acenaram
As flores todas, abrindo:
«Maria!»
E Ella deixou do Infinito
Os resplendentes fulgores,
Para acudir ao bemdito
Aceno doce das flores.
E teve pena de vel-as
Formosas, mas sem ter brilho:
Olhou sorrindo as estrellas
Dos cabellos de seu Filho...
Ah! fôra Ella que as fizera
Com a graça de seu sorriso,
N’um dia de Primavera,
Na gloria do Paraiso!
E seus olhos procuraram
Algum occulto thesouro:
«Para as flôres que faria?»
Quando do Céo à chamaram
Os Anjos todos, em coro:
«Maria!»
Ia partir... Que lembrança
Podia deixar no campo?
Dera o sorriso á creança,
Estrellas ao pyrilampo!
Nos meigos olhos perpassa
Não sei que lampejo doce...
E a Virgem, cheia de graça,
Do mundo triste evolou-se.
Mas, Ella, que dera o encanto
Do riso sagrado á infancia,
Da dobra azul de seu manto
Deixou cahir a fragrancia.
Desde esse dia, na Terra,
As flores sabem fallar...
A voz da flor é a ambrosia
Que tanta doçura encerra
Quando murmura ao luar:
«Maria!»
Jardim — Agosto de 1897.