Horto (1910)/Versos ligeiros
Eu acho tão feiticeira
A Noemita da esquina,
Com o seu recato de freira,
Muito morena e franzina;
Que fico toda encantada
Quando na Egreja a contemplo,
Pois cuido ver uma fada,
Ajoelhada no Templo.
Doce nuvem còr de rosa
Parece que a Deus se eleva,
D’aquella bocca mimosa,
D’aquelle olhar cor de treva.
E’ sua prece que vôa,
Indefinida e tão mansa,
Como um hymno que resôa,
Como uma voz de creança.
A trança de seu cabello,
(Como ella é negra, Jesus!)
Semelha um lindo novello
Tão preto que já reluz.
Tem a boquinha vermelha
Como uma rosa entreabrindo...
E’ um favo de mel de abelha
Aquella bocca sorrindo!
Minh’alma nunca se cança
De vel-a assim, tão divina,
Sempre formosa e creança
Com o seu perfil de menina.
A ’s vezes, eu olho-a tanto,
Com tanta veneração,
Que fico muda de espanto,
Depois da contemplação.
E’ verdade que não faz
Mal nenhum fital-a assim...
Meu Deus! si eu fosse rapaz
O que diriam de mim?!
Macahyba — 1897.