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I-Juca-Pirama/Canto IX

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IX.

Isto dizendo, o miserando velho
A quem Tupan tamanha dor, tal fado
Já nos confins da vida reservara,
Vae com tremulo pé, com as mãos já frias
Da sua noite escura as densas trevas
Palpando. — Alarma! alarma! — O velho pára
O grito que escutou é voz do filho,
Voz de guerra que ouvio ja tantas vezes
N’outra quadra melhor. — Alarma! alarma!
— Esse momento só vale apagar-lhe—
Os tão compridos trances, as angustias,
Que o frio coração lhe atormentarão
De guerreiro e de pae: — vale, e de sobra.
Elle que em tanta dôr se contivera,
Tomado pelo subito contraste,
Desfaz-se agora em pranto copioso,
Que o exhaurido coração remoça.

A taba se alborota, os golpes descem,
Gritos, imprecações profundas soão,
Emmaranhada a multidão braveja,

Revolve-se, ennovela-se confusa,
E mais revolta em mor furor se accende.
E os sons dos golpes que incessantes fervem,
Vozes, gemidos, estertor de morte
Vão longe pelas ermas serranias
Da humana tempestade propagando
Quantas vagas de povo enfurecido
Contra um rochedo vivo se quebravão.

Era ello, o Tupi; nem fòra justo
Que a fama dos Tupis — o nome, a gloria,
Aturado labor de tantos annos,
Derradeiro brasão da raça extincta,
De um jacto e por um só se aniquilasse.

— Basta! clama o chefe dos Tymbiras,
— Basta, guerreiro illustre assás lutaste,
— E para o sacrificio é mister forças. —

O guerreiro parou, cahio nos braços
Do velho pae, que o cinge contra o peito,
Com lagrimas de jubilo bradando:
«Este, sim, que é meu filho muito amado!
«E pois que o acho em fim, qual sempre o tive,

«Corrão livres as lagrimas que choro,
«Estas lagrimas, sim, que não deshonrão».