João Ferreira de Almeida 1819 (ortografia atualizada)/João/XII

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  1. VEIO pois Jesus seis dias antes da Páscoa a Betânia, aonde estava Lázaro, o que falecera, a quem ressuscitara dos mortos.
  2. Fizeram-lhe pois ali uma ceia, e Marta servia; e Lázaro era um dos que juntamente com ele à mesa estavam assentados.
  3. Tomando pois Maria um arrátel de unguento de nardo puro, de muito preço, ungiu os pés a Jesus, e alimpou-lhe os pés com seus cabelos; e encheu-se a casa do cheiro do unguento.
  4. Então disse Judas de Simão Iscariota, um de seus Discípulos, o que o havia de trair:
  5. Por que se não vendeu este unguento por trezentos dinheiros, e se deu aos pobres?
  6. E isto disse ele, não pelo cuidado que tivesse dos pobres; mas porque era ladrão, e tinha a bolsa, e trazia o que se lançava nela.
  7. Disse pois Jesus: Deixa-a; para o dia de meu enterro guardou isto.
  8. Porque aos pobres sempre convosco os tendes; porém a mim sempre me não tendes.
  9. Entendeu pois muita companhia dos Judeus, que ele estava ali; e vieram, não somente por amor de Jesus, mas também por ver a Lázaro, a quem ressuscitara dos mortos.
  10. E consultaram os Príncipes dos Sacerdotes, de também matarem a Lázaro.
  11. Porque muitos dos Judeus iam por amor dele, e criam em Jesus.
  12. O seguinte dia, ouvindo uma grande companhia, que vieara ao dia da Festa, que Jesus vinha a Jerusalém.
  13. Tomaram ramos de plantas e lhe saíram ao encontro, e clamavam: Hosana; Bendito aquele que vem no nome do Senhor, o Rei de Israel.
  14. E achou Jesus um asninho, e assentou-se sobre ele, como está escrito:
  15. Não temas, ó filha de Sião; eis aqui teu Rei vem assentado sobre o poldro[1] de uma asna.
  16. Porém isto não entenderam seus Discípulos ao princípio; mas sendo Jesus já glorificado, então se lembraram que isto dele estava escrito, e que isto lhe fizeram.
  17. A companhia pois, que estava com ele, testificava, que a Lazaro chamara da sepultura, e o ressuscitara dos mortos.
  18. Pelo que também a companhia lhe saiu ao encontro, porquanto ouvira que fizera este sinal.
  19. Disseram pois os Fariseus entre si: vedes que nada aproveitais? eis que o mundo se vai após ele.
  20. E havia alguns Gregos, dos que haviam subido a adorarem no dia da Festa.
  21. Estes pois vieram a Filipe, que era de Betsaida de Galileia, e rogaram-lhe, dizendo: Senhor, queríamos ver a Jesus.
  22. Veio Filipe, e disse-o a André; e André então e Filipe o disseram a Jesus.
  23. Porém Jesus lhes respondeu, dizendo: Vinda é a hora, que o Filho do homem há de ser glorificado.
  24. Em verdade, em verdade vos digo, se o grão de trigo, que cai na terra, não morrer, ele fica só; porém se morrer, muito fruto dá.
  25. Quem ama sua vida, perdê-la-á; e quem neste mundo aborrece sua vida, a guardará para a vida eterna.
  26. Se alguém me serve, siga-me; e onde eu estiver, ali estará também meu servidor. E se alguém me servir, o Pai o há de honrar.
  27. Agora está turbada minha alma; e que direi? Pai, salva-me desta hora; mas por isso vim a esta hora.
  28. Pai, glorifica teu Nome. Veio pois uma voz do céu, que dizia: e já o tenho glorificado, e outra vez o glorificarei.
  29. A companhia pois que ali estava, e a ouviu, dizia: que havia sido trovão. Outros diziam: algum Anjo lhe tem falado.
  30. Respondeu Jesus e disse: não veio esta voz por amor de mim, senão por amor de vós outros.
  31. Agora é o juízo deste mundo; agora será lançado fora o Príncipe deste mundo.
  32. E eu, quando for levantado da terra, a todos trarei a mim.
  33. (E isto dizia, significando de que morte havia de morrer.)
  34. Respondeu-lhe a companhia: da Lei temos ouvido, que o Cristo permanece para sempre; e como dizes tu, que convém que o Filho do homem seja levantado? quem é este Filho do homem?
  35. Disse-lhes pois Jesus: ainda por um pouco de tempo a luz está convosco; andai enquanto tendes luz, para que as trevas vos não apanhem. E quem anda em trevas, não sabe aonde vai.
  36. Enquanto tendes luz, crede na luz, para que sejais filhos da luz. Estas coisas falou Jesus, e indo-se, escondeu-se deles.
  37. E ainda que perante eles tinha feito tantos sinais, nem por isso criam nele.
  38. Para que se cumprisse a palavra do Profeta Isaías, que disse: Senhor, quem creu nossa pregação? e a quem o braço do Senhor foi revelado?
  39. Por isso não podiam crer, porquanto outra vez Isaías disse:
  40. Os olhos lhes cegou, e o coração lhes endureceu; para que dos olhos não vejam, e do coração não entendam, e se convertam, e eu os cure.
  41. Isto disse Isaías, quando viu sua glória, e falou dele.
  42. Contudo ainda até dos Príncipes também creram muitos nele; mas não o confessavam por amor dos Fariseus; por não serem lançados da Sinagoga.
  43. Porque amavam mais a glória dos homens, do que a glória de Deus.
  44. E clamou Jesus, e disse: Quem crê em mim, não crê em mim, senão naquele que me enviou.
  45. E quem a mim vê, vê a aquele que me enviou.
  46. Eu sou a luz que vim ao mundo, para que todo aquele que crê em mim, não permaneça em trevas.
  47. E se alguém ouvir minhas palavras, e as não crer, não o julgo eu. Porque não vim a julgar ao mundo, mas salvar ao mundo.
  48. Quem a mim me enjeitar, e minhas palavras não receber, já tem quem o julgue; a palavra que tenho falado, essa o há de julgar no último dia.
  49. Porque eu não tenho falado de mim mesmo; porém o Pai que me enviou, ele me deu mandamento do que hei de dizer, e do que hei de falar.
  50. E sei que seu mandamento é vida eterna. Assim que o que eu falo, assim o falo, como o Pai me tem dito.

Notas[editar]

  1. poldro — Definição: filhote, no caso de uma jumenta