Nas Praças
Aspeto
- Nas praças vindouras — talvez as mesmas que as nossas —
- Que elixires serão apregoados?
- Com rótulos diferentes, os mesmos do Egito dos Faraós;
- Com outros processos de os fazer comprar, os que já são nossos.
- E as metafisicas perdidas nos cantos dos cafés de toda a parte,
- As filosofias solitárias de tanta trapeira de falhado,
- As idéias casuais de tanto casual, as intuições de tanto ninguém —
- Um dia talvez, em fluido abstrato, e substância implausível,
- Formem um Deus, e ocupem o mundo.
- Mas a mim, hoje, a mim
- Não há sossego de pensar nas propriedades das coisas,
- Nos destinos que não desvendo,
- Na minha própria metafisica, que tenho porque penso e sinto
- Não há sossego,
- E os grandes montes ao sol têm-no tão nitidamente!
- Têm-no? Os montes ao sol não têm coisa nenhuma do espírito.
- Não seriam montes, não estariam ao sol, se o tivessem.
- O cansaço de pensar, indo até ao fundo de existir,
- Faz-me velho desde antes de ontem com um frio até no corpo.
- E por que é que há propósitos mortos e sonhos sem razão?
- Nos dias de chuva lenta, contínua, monótona, uma,
- Custa-me levantar-me da cadeira onde não dei por me ter sentado,
- E o universo é absolutamente oco em torno de mim.
- O tédio que chega a constituir nossos ossos encharcou-me o ser,
- E a memória de qualquer coisa de que me não lembro esfria-me a alma.
- Sem dúvida que as ilhas dos mares do sul têm possibilidades para o sonho,
- E que os areais dos desertos todos compensam um pouco a imaginação;
- Mas no meu coração sem mares nem desertos nem ilhas sinto eu,
- Na minha alma vazia estou,
- E narro-me prolixamente sem sentido, como se um parvo estivesse com febre.
- Fúria fria do destino,
- Interseção de tudo,
- Confusão das coisas com as suas causas e os seus efeitos,
- Conseqüência de ter corpo e alma,
- E o som da chuva chega até eu ser, e é escuro.