Ecos da minh'alma/A saudade
Saudade! gosto amargo d'infelizes.
Delicioso pungir de acerbo espinho,
Que m'stás repassando o intimo peito
Com dor, que os seios d’alma dilacera,
— Mas dôr que tem prazeres.
Garret. Poem, Camões.
No meu seio uma flor d’esperança
Cultivei com desvelo perfeito;
Mas o rijo tufão da desgraça
Arrancou-me a florinha do peito.
Ella foi ’n um abysmo funesto
De cruel desengano cahir,
E após veio a mais negra saudade
Com espinhos minh’alma pungir.
Tu ao menos, ó flor de infelizes,
Tu ao menos não me has de deixar;
Si a desgraça plantou-te em meu peito,
D’elle mais te não póde arrancar.
Essas vãs alegrias do mundo,
Esses gozos que o mundo aprecia,
Eu os tróco, saudade adorada,
Pela tua fiel companhia.
Emquanto eu existir, do martyrio,
Vivirás, p’ra me dares a palma;
Si a ventura tentasse levar-te,
Levaria comtigo minh’alma.
Tu ao menos, ó flor de infelizes,
Tu ao menos não me has de deixar;
Si a desgraça plantou-te em meu peito,
D’elle mais te não póde arrancar.
Nem espero que mude meu fado;
E si attento em meu triste futuro,
Nelle vejo — indiziveis angustias
Um sepulchro cavando-me escuro!
Praza a Deus, que com tantos desgostos,
Minha pobre razão não feneça;
Que a saudade me não desampare,
Nem seu dôce motivo eu esqueça.
Sim, permitte, Senhor, que em minh’alma
Ache sempre uma imagem querida,
Que, a despeito da sorte mesquinha,
Me atormente, encantando-me a vida.
Que essas vãs alegrias do mundo,
Esses gozos que o mundo aprecia,
Da saudade adorada eu os tróco
Pela dôce e fiel companhia.
21 de Abril de 1850.