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O Saci (8ª edição)/10

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A floresta


POIS assim é, continuou o saci. A lei da floresta é a lei de quem pode mais — ou por ter mais força, ou por ser mais agil, ou por ser mais astuto. A astucia, principalmente, é uma grande coisa na floresta. Está vendo ali aquele galhinho seco?

— Sim. Um galhinho como outro qualquer, respondeu o menino.

— Pois está muito enganado, replicou o saci. Não é galho nenhum, sim um bichinho que finge de galho seco para não ser atacado pelos inimigos.

Pedrinho não quis acreditar, mas cotucando o galhinho viu que ele se mexia. Ficou assombrado da esperteza.

— Bem diz vóvó que a mata é perigosa! Um que não sabe ha de levar cada logro aqui...

— E aquilo? perguntou o saci apontando para uma folha. Que parece a você que aquilo é?

Pedrinho olhou; viu bem que era uma folha de arvore; mas como já estava ficando sabido nas traições da mata, piscou para o saci e disse:

Desta vez não caio na esparrela. Parece que é uma folha, mas com certeza é outro bichinho que se disfarça em folha. E cotucou-a para ver se se mexia. A folha, porém, não se mexeu.

— E´ folha mesmo, seu bobo, disse o saci dando uma risada. Inda é muito cedo para você “ler” a mata. Isto é livro que só nós, que aqui nascemos e vivemos toda vida, somos capazes de interpretar. Um bobinho da cidade, como você, entende tanto da natureza como eu entendo de grego.

— Realmente, saci! Estou vendo que aqui na mata sou um perfeito bobinho. Mas deixe estar que ainda ficarei tão sabido como você.

— Sim, com o tempo e muita observação. Quem observa e estuda, acaba sabendo. Aqui, porém, nós não precisamos estudar. Nascemos sabendo. Temos o instinto de tudo. Qualquer desses bichinhos que você vê, mal sai dos casulos e já se mostra espertissimo, não precisando dos conselhos dos pais. Bem consideradas as coisas, Pedrinho, parece que não ha animal mais estupido e lerdo para aprender do que o homem, não acha?

O orgulho do menino ofendeu-se com aquela observação. Um miseravel saci a fazer pouco caso do rei dos animais! Era só o que faltava...

— O que você está dizendo, replicou Pedrinho, é tolice pura sem mistura. O homem é o rei dos animais. Só o homem tem inteligencia. Só ele sabe construir casas de todo o jeito, e maquinas, e pontes, e aeroplanos, e tudo quanto ha. Ah, o homem! Você não sabe que o homem é, saci! Era preciso que tivesse lido os livros que eu li em casa de vóvó...

Esta obra entrou em domínio público pela lei 9610 de 1998, Título III, Art. 41.


Caso seja uma obra publicada pela primeira vez entre 1929 e 1977 certamente não estará em domínio público nos Estados Unidos da América.