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O moço loiro/Introdução

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Ce livre
Tremble et palpite sous vos pieds.
V. Hugo

SENHORAS!


Para que nascesse O moço loiro influíram fortemente em mim dois sentimentos nobres e profundos.

No empenho de escrever — a gratidão.

Na concepção e desenvolvimento do romance — a esperança.

Um ano há decorrido desde que um jovem desconhecido, sem habitações, com fracos e limitadíssimos recursos intelectuais, mas rico de vontade e de bons desejos; temeroso e quase à força ofereceu à generosidade do público do Rio de Janeiro um pobre fruto de sua imaginação — A moreninha — que ele amava, como filha de sua alma. Esse jovem, senhoras, fui eu.

Fui eu, que, com meus olhos de pai, a segui em sua perigosa vida, temendo vê-la cair a cada instante no abismo do esquecimento... fui eu que (talvez ainda com vaidade de pai) cheguei a crer que o público a não enjeitava; e, sobretudo, que minha querida filha tinha achado corações angélicos, que, dela se apiedando, com o talismã sagrado de sua simpatia a levantaram mesmo muito acima do que ela merecer podia. E esses corações, senhoras, foram os vossos.

Oh! mas é preciso ser autor, ao menos pequenino autor, como eu sou, para se compreender com que imenso prazer, com que orgulho eu sonhava vossos belos olhos pretos brasileiros, derramando os brilhantes raios de suas vistas sobre as páginas do meu livro! vossos lábios cor-de-rosa docemente sorrindo-se às travessuras da Moreninha!

E desde então eu senti que devia um eterno voto de agradecimento a esse público, que não enjeitara minha cara menina; e que mais justa dedicação me prendia aos pés dos cândidos seres, que haviam tido compaixão de minha filha.

E, pobre como sou, convenci-me para logo que não daria nunca um penhor dos sentimentos, que em mim fervem, se o não fosse buscar no fundo d’alma, colhendo minhas idéias, e delas organizando um pensamento.

E, acreditando que me não devia envergonhar da oferta, porque dava o que dar podia; e porque, assim como o perfume é a expressão da flor, o pensamento é o perfume do espírito; eu quis escrever...

No empenho de escrever, pois, influiu em mim — a gratidão.

Ora, o pensamento que dessas idéias pretendia organizar era — um romance; mas, fraco e desalentado, o que poderia exercer em mim influência tão benigna e forte, que, mercê dela, conseguisse eu conceber (mesmo deforme como é) O moço loiro, e chegasse a terminá-lo? o quê?... — a esperança.

Porque a esperança — é um alimento — sim! o mais doce alimento do espírito!

E tudo quanto eu esperei, espero ainda.

Espero que minhas encantadoras patrícias vejam em O moço loiro, um simples e ingênuo tributo de gratidão a elas votado; e espero também que o público, que outrora me animou, e a quem muito devo, de tal tributo se apraza; pois sei que sempre lisonjeiro lhe é ver render cultos aos astros brilhantes de seu claro céu, às mimosas flores de seu ameno prado.

Espero ainda que meu novo filho não será lançado ao longe, como fruto verde e ingrato ao paladar... que O moço loiroserá, ao menos por piedade, aceito e compreendido.

Espero mais, senhoras, que generosas sempre, perdoando as imperfeições e graves defeitos de O moço loiro, não querereis perguntar a seu débil pai — como ousas escrever? — Oh! não mo perguntareis; porque há em vós bastante ardor, imaginação e poesia para sentir que às vezes o desejo de escrever é forte, qual o instinto, que manda beber água para apagar a sede, e comer para matar a fome; que às vezes o pensamento arde, e se consome em fogo; e que então é inevitável deixar sair as chamas desse fogo... as idéias desse pensamento...

Espero finalmente que vós, senhoras, dignando-vos adotar O moço loiro, permitireis que ele, coberto com a égide de vosso patrocínio, possa obter o favor e encontrar o abrigo que à sua irmã não foi negado.

Sim! que este pobre menino, saído apenas do tão frio e abatido seio de seu pai, se anime e aqueça à vossa sombra!... que, por uma compensação, pela mais suspirada das compensações, esse passado de gelo e de abatimento para sempre esquecido ante o ardor e a felicidade do futuro!...

Oh! que não seja uma ilusão a minha esperança!...

Consenti, pois, senhoras, que me eu atreva a dedicar-vos O moço loiro, como um primeiro e fraco sinal de reconhecimento, que há de durar sempre...

Inspirado pela gratidão, é ele semelhante a uma inocente flor depositada com religioso respeito no altar e aos pés dos anjos.

Filho da esperança, pode parecer-se com brando suspiro do coração, que almeje cair no seio da beleza...

E, enfim, como um franguinho infante, que medroso dos camaradas corre a acolher-se no materno colo, O moço loiro convosco se apadrinha, senhoras, e a cada uma de vós repete as palavras do salmo:

"Protege-me com a sombra de tuas asas!"'

O autor