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Página:A Dança do Destino - Lutegarda Guimarães de Caires (1913).pdf/54

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Collecção Antonio Maria Pereira

Foi melhor assim; não deu pelo sen fim e não havia que incomodar ninguem com o seu enterro, porque já estava sepultado.

Mas com isto é que se não conformou a policia, porque exhumou o cadaver e levou-o para o necroterio para ser autopsiado.

Não era só morrer assim, comodamente, sem dar satisfações à autoridade e som o respectivo bilhete de enterramento: agora havia de ser aberto, retalhado e examinado, para se vêr o que tinha dentro.

Em vida ninguem se importou saber d'êle, quando o desgraçado tinha frio e fome; agora tudo eram disvelos e cuidados!

Isto veio nos jornaes, foi ha pouco tempo: não viram a noticia?

Eu li-a. Li e chorei. Porque o tivesse conhecido? Nunca o vi, nem jamais ouvira antes falar d'êle.

Mas comoveu-me extraordinariamente! como sempre me comovem estes trechos de tragedias ignoradas.

Magoou a minha sentimentalidade esta existencia humana, esfarrapada pela fatalidade, tratada a pontapés pelo destino, essa engrenagem terrivel do turbilhão universal, especie de Titan, d'uma estatura brutal e pavorosa, terrivelmente misteriosa e incognita, vivendo na obscuridade infinita, sombrio e brilhante ao mesmo tempo, capaz de fazer nascer perolas em esterquilinios e transformar anjos em monstros.

E vizionei o horrivel viver d'essa creatura, as caminhadas de um dia inteiro, para alcançar um pe-