E as pobres enfermas, ouvindo as modulações da voz da Cotovia, sentiam como que uma dôr de menos, no alivio do presentimento, que antes as oprimia, e agora, com o canto d'ela, se desfazia.
Mas essa voz era tão fraca naquela noite, que só o grande silencio da vasta enfermaria lhes permitia ouvil-a.
Era uma vozita de sonho, e as notas foram esmorecendo tanto e tanto que se extinguiram, como num sôpro...
Sentiu-se então como que am roçar de azas que voam... Um frio glacial perpassou por esse vasto viveiro do sofrimento, quando o palido clarão da aurora envolveu a alva cabeça da Cotovia, que, imobilisada, dormia o seu ultimo e eterno somno...
Chegaram uns empregados.
E um exclamou:
— Olha! esta já pateou.
— Ah! foi a Cotovia — respondeu o outro — acabou-se a musicata: naturalmente está cantando no outro mundo.
Os passos afastaram-se.
Então a rapariguinha muito pálida, com o rosto inundado de lagrimas, murmurava, num soluço:
— Meu Deus, pobre Cotovia! Ainda ha pouco cantava, e agora...
Agora?... Uma existencia d'um seculo, diluida muma lagrima de saudade!...