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A esperança
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monias do universo. Enganaste-te perfeitamente, confundiste essa pequena sociedade de homens bons com a rele prozaica, com a gentalha sem brio e sem pundonôr . E como poderiam ellez atirar com o lôdo da zombaria á face das Saphos, das Sevignes, e das Stael, se não podem arredar os braços da cruz em que o mundo os tem presos, martyres da sua dedicação, do seu amôr, e do seu desinteresse? Que poeta ha ahi que o não seja por uma mulher! Existiria Petrarcha sem Laura, Tasso sem Leonor, Camões sem Natercia, e Dirceu sem Marillia? Lamartine escreve as suas mais belas sentimentaes harmonias, junto do berço da sua filha, que adormece, rindo, ou inclinado sobre o seu mausuleu, chorando. Não ha insignificante rimador que não julgou a mulher o pomo da felicidade, ainda que, algumas vezes nos lance fóra do paraizo. Se não fôra a saudade gravada nas pegadas impressas por minha mãe, na estrada, que a levou á campa, ainda hoje não seria poeta.

Eis as considerações que me dispertou o teu resentimento . Talvez encontrarás nellas falta de pensamentos sublimes, nenhum atavio no estylo, mas deverás ficar na certeza de que tudo isto são verdades do coração.

Porto 10 d'abril de 1865.

 
 
Bardo

Universo, ah! que és tu se não a taça
Para o pranto sorver do triste humano!..
E tu que és mais que dôr, ó existencia
Que mais és que martyrio e soffrimento?!
Sobre a terra não há felicidade!
Fantastica deidade, é nome vão!
É mentida tambem fogueira esp'rança.
Que venturas promette que não servem
Mais que para illudir a triste vida,
Depois attroz, fatal, o desengano
N'um abysmo de dôr nos lança afflictos!..

E o semblante da virgem sobre o peito,
Co'a pallidez, da morte lhe pendia
E do Bardo infeliz, sentido pranto
Nas faces da donzella já corria.

Bardo

Vive, ó minha Olinda! vive ou leva
Comtigo o teu amante á sepultura,
Soffrendo mil saudades, não o deixes
Sósinho, sem amparo sobre o mundo!
O meu céo, vida, luz, eras só tu!
A estrella que na terra me guiou,
O sol que o coração m'incendiava
Com os celestes raios de teus olhos!
A aurora que espargia na minh'alma
Perfumes que aspirava ébrio de gozo!..
A existencia fruir sem ti não posso!
Ligadas por amor as vidas nossas
Que extingua a morte crua d'um só córte?..

Olinda inda respira e os olhos ergue
Para o terno amador que delirante,
Caricias mil lhe faz, um beijo imprime
Nos labios que sorrir-lhe vê um instante.

Olinda

Sabino! enchuga o pranto, não lamentes
Quem nos teus braços morre tão ditosa!
O Creador ouviu as preces minhas,