Não conseguia falar.
Narizinho trouxe um copo dágua.
— Beba! — ordenou.
A negra bebeu um gole e continou nos "ah, ah, ah" de quem perdeu o fôlego, só que mais molhados. Por fim, depois duns cinco minutos, conseguiu desatar a língua.
— Vamos embora daqui, Sinhá. O Sítio está enfeitiçado. Nem queira saber o que eu vi lá na grota ...
— Mas que foi? Fale..
— Um bicho impossível, Sinhá. Pior que o Minotauro. Era tanta perna . . .
Com muita dificuldade a boa negra explicou o acontecido. Estava já no fim do corte das folhas de caeté, quando ergueu os olhos e deu com uma coisa compridíssima, parada, olhando para ela.
— Era um bicho sem fim, amarelo sujo, grosso como um tronco de árvore e com aquela infinidade de pernas.
— Infinidade de pernas? — repetiu Dona Benta. — Como isso? Todos os animais têm duas, quatro ou seis pernas como os insetos. Bicho com infinidade de pernas não há.
— Há, sim! — lembrou Emília. — A centopeia tem cem.
— É verdade — disse Dona Benta — mas a centopeia é um pobre bichinho insignificante, aí de poucos centímetros de tamanho.
— Mas pode ter aparecido alguma grande — disse Emília.
— Como aparecido, boba? Os animais não vão aparecendo assim sem mais nem menos.
— Pode, sim; alguma, por exemplo, que tenha a glândula pituitária muito desenvolvida ...
Dona Benta arregalou os olhos. Aquilo de Emília falar em pituitária estava-lhe parecendo ainda mais estranho do que a "alucinação" de tia Nastácia.
— Que história é essa, Emília?
— Foi o Visconde que me ensinou o caso das glândulas...
— Hum!
Nastácia continuou a descrever o monstro, e por fim Dona Benta teve de concordar com Emília. Sim, só podia ser uma gigantesca centopeia. Mas . . . mas, como?
Pedrinho já estava de bodoque em punho.
— Eu vou ver, vovó, e se for verdade...