Página:A Relíquia.djvu/133

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um gato branco no collo. O que me prendeu logo foram os seus olhos azues-claros, d’um azul que só ha nas porcelanas, simples, celestes, como eu nunca vira na morena Lisboa. Mas encanto maior ainda tinham os seus cabellos, crespos, frisadinhos como uma carapinha d’ouro, tão dôces e finos que appetecia ficar eternamente e devotamente a mexer-lhes com os dedos tremulos; e era irresistivel o profano nimbo luminoso que elles punham em torno da sua face gordinha, d’uma brancura de leite onde se desfez carmezim, toda tenra e succulenta. Sorrindo, e baixando com sentimento as pestanas escuras, perguntou-me se eu queria pellica ou Suecia.

Eu murmurei, roçando-me sôfregamente pelo balcão:

— Trago-lhe recadinhos do Alpedrinha.

Ella escolheu entre o ramo um timido botão de rosa, e deu-m’o na ponta dos dedos. Eu trinquei-o, com furor. E a voracidade d’esta caricia pareceu agradar-lhe, porque um sangue mais quente veio afoguear-lhe a face — e chamou-me baixo «mausinho!» Esqueci S. José e a sua jaculatoria — e as nossas mãos, um momento unidas para ella me calçar a luva clara, não se desenlaçaram mais, n’essas semanas que