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A CIDADE E AS SERRAS

E disse a coçar a cabeça: «Eh! que maçada! Eh! que maçada!»

Depois do banho e do chocolate, às dez horas, consolado e quentinho dentro do roupão de veludo, rompi pelo quarto do meu Príncipe, de braços abertos e sedentos:

— Oh Jacinto!

— Oh viajante!...

Quando nos estreitámos, fartamente, eu recuei para lhe contemplar a face — e nela a alma. Encolhido numa quinzena de pano cor de malva orlada de peles de marta, com os pêlos do bigode murchos, as suas duas rugas mais cavadas, uma moleza nos ombros largos, o meu amigo parecia já vergado sob o peso e a opressão e o terror do seu dia. Eu sorri, para que ele sorrisse:

— Valente Jacinto... Então como tens vivido?

Ele respondeu, muito serenamente:

— Como um morto.

Forcei uma gargalhada leve, como se o seu mal fosse leve:

— Aborrecidote, hem?

O meu Príncipe lançou, num gesto tão vencido, um oh tão cansado — que eu compadecido de novo o abracei, o estreitei, como para lhe comunicar uma parte desta alegria sólida e pura que recebi do meu Deus!


Desde essa manhã, Jacinto começou a mostrar claramente, escancaradamente, ao seu Zé Fernandes, o tédio de que a existência o saturava. O seu cuidado realmente e o seu esforço consistiram então em sondar e formular esse

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