Mas nada o aterrou como o trasbordo em Medina del Campo, de noite, nas trevas da Velha Castela. Debalde a Companhia do Norte de Espanha e de Salamanca, por cartas, por telegramas, sossegaram o meu camarada, afirmando que, quando ele chegasse no comboio de Irun dentro do seu salão, já outro salão ligado ao comboio de Portugal esperaria, bem aquecido, bem alumiado, com uma ceia que lhe ofertava um dos Directores, D. Esteban Castillo, ruidoso e rubicundo conviva do 202! Jacinto corria os dedos ansiosos pela face: — «E os sacos, as peles, os livros, quem os transportaria do salão de Irun para o salão de Salamanca?» Eu berrava, desesperado, que os carregadores de Medina eram os mais rápidos, os mais destros de toda a Europa! Ele murmurava: — «Pois sim, mas em Espanha, de noite!...» A noite, longe da Cidade, sem telefone, sem luz eléctrica, sem postos de polícia, parecia ao meu Príncipe povoada de surpresas e assaltos. Só acalmou depois de verificar no Observatório Astronómico, sob a garantia do sábio professor Bertrand, que a noite da nossa jornada era de Lua-cheia!
Enfim, na sexta-feira, findou a tremenda organização daquela viagem histórica! O sábado predestinado amanheceu com generoso sol, de afagadora doçura. E eu acabava de guardar na mala, embrulhadas em papel pardo, as fotografias das criaturinhas suaves que, nesses vinte e sete meses de Paris, me tinham chamado «mon petit chou! mon rat cheri!» — quando Jacinto rompeu pelo quarto, com um soberbo ramo de orquídeas na sobrecasaca, pálido e todo nervoso.