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A CIDADE E AS SERRAS

de Jacinto, e o Jornal do Comércio que nos era comum. Através das janelas escancaradas, sem vidraças, o grande ar da serra entrava e circulava como num eirado, com um cheiro fresco de horta regada. Mas o que avistávamos, da beira da enxerga, era um pinheiral cobrindo um cabeço e descendo pelo pendor suave, à maneira duma hoste em marcha, com pinheiros na frente, destacados, direitos, emplumados de negro; mais longe as serras de além rio, duma fina e macia cor de violeta; depois a brancura do céu, todo liso, sem uma nuvem, duma majestade divina. E lá debaixo, dos vales, subia, desgarrada e melancólica, uma voz de pegureiro cantando.

Jacinto caminhou lentamente para o poial duma janela, onde caiu esbarrondado pelo desastre, sem resistência ante aquele brusco desaparecimento de toda a Civilização! Eu palpava a enxerga, dura e regelada como um granito de Inverno. E pensando nos luxuosos colchões de penas e molas, tão prodigamente encaixotados no 202, desafoguei também a minha indignação:

— Mas os caixotes, caramba?... Como se perdem assim trinta e tantos caixotes enormes?...

Jacinto sacudiu amargamente os ombros:

— Encalhados, por aí, algures, num barracão!... Em Medina, talvez, nessa horrenda Medina. Indiferença das Companhias, inércia do Silvério... Enfim a Península, a barbárie!

Vim ajoelhar sobre o outro poial, alongando os olhos consolados por céu e monte:

— É uma beleza!

O meu Príncipe, depois de um silêncio grave, murmurou, com a face encostada à mão:

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