na fornalha das cidades, ideando gozos que nunca se realizam, aspirando a certezas que nunca se atingem!... E é o que aconselham estas colinas e estas árvores à nossa alma, que vela e se agita: — que vive na paz dum sonho vago e nada apeteça, nada tema, contra nada se insurja, e deixe o Mundo rolar, não esperando dele senão um rumor de harmonia, que a embale e lhe favoreça o dormir dentro da mão de Deus. Hem, não te parece, Zé Fernandes?
— Talvez. Mas é necessário então viver num mosteiro, com o temperamento de S. Bruno, ou ter cento e quarenta contos de renda e o desplante de certos Jacintos... E também me parece que andámos léguas. Estou derreado. E que fome!
— Tanto melhor, para as trutas, e para o cabrito assado que nos espera...
— Bravo! Quem te cozinha?
— Uma afilhada do Melchior. Mulher sublime! Hás-de ver a canja! Hás-de ver a cabidela! Ela é horrenda, quase anã, com os olhos tortos, um verde e outro preto. Mas que paladar! Que génio!
Com efeito! Horácio dedicaria uma ode àquele cabrito assado num espeto de cerejeira. E com as trutas, e o vinho do Melchior, e a cabidela, em que a sublime anã de olhos tortos pusera inspirações que não são da terra, e aquela doçura da noite de Junho, que pelas janelas abertas nos envolveu no seu veludo negro, tão mole e tão consolado fiquei, que, na sala onde nos esperava o café, caí numa cadeira de verga, na mais larga, e de melhores almofadas, e atirei um berro de pura delícia.