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Página:A correspondencia de Fradique Mendes (1902).djvu/207

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olhos, que eu possuía muitos papéis! muitas apólices! muitas inscrições!... Pois na primeira manhã que voltei, depois dessa revelação, à casa de hóspedes, Pinho, ligeiramente corado, quase comovido, ofereceu-me uma boceta de doce de tijolo embrulhada num guardanapo. Ato tocante, que explica aquela alma! Pinho não é um egoísta, um Diógenes de rabona preta, secamente retraído dentro da pipa da sua inutilidade. Não. Há nele toda a humana vontade de amar os homens seus semelhantes, e de os beneficiar. Somente quem são, para Pinho, os seus genuínos «semelhantes»? Os prestamistas do Estado. E em que consiste para Pinho o ato de benefício? Na cessão aos outros daquilo que a ele lhe é inútil. Ora Pinho não se dá bem com o uso da goiabada—e logo que soube que eu era um possuidor de inscrições, um seu semelhante, capitalista como ele, não hesitou, não se retraiu mais ao seu dever humano, praticou logo o ato de benefício, e lá veio, ruborizado e feliz, trazendo o seu doce dentro dum guardanapo.

É o comendador Pinho um cidadão inútil? Não, certamente! Até para manter em estabilidade e solidez, a ordem duma nação, não há mais prestadio cidadão do que este Pinho, com a sua placidez de hábitos, o seu fácil assentimento a todos os feitios da coisa pública, a sua conta do banco verificada às sextas-feiras, os seus prazeres colhidos em higiênico recato, a sua reticência, a sua inércia. Dum Pinho