Página:A correspondencia de Fradique Mendes (1902).djvu/221

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através do feijoal. Nos esteios de pedra que sustentam a vinha há por vezes uma cruz gravada, ou um coração sagrado, ou o monograma de Jesus Toda a quinta, assim santificada por signos devotos, lembra uma sacristia onde os tectos fossem de parra, a relva cobrisse os soalhos, por cada fenda borbulhasse um regato, e o incenso saísse dos cravos.

Mas, com todos estes emblemas sacros, nada há que nos mova, ou severamente nos arraste, aos renunciamentos do mundo. A quinta foi sempre, como agora, de grossa fartura, toda em campos de pão, bem arada e bem regada, fecunda, estendida ao sol como um ventre de Ninfa antiga. Os frades excelentes que nela habitaram amavam largamente a terra e a vida. Eram fidalgos que tomavam serviço na milícia do Senhor, como os seus irmãos mais velhos tomavam serviço na milícia de El-Rei—e que, como eles, gozavam risonhamente os vagares, os privilégios e a riqueza da sua Ordem e da sua Casta. Vinham para Refaldes, pelas calmas de Julho, em seges e com lacaios. A cozinha era mais visitada que a igreja —e todos os dias os capões alouravam no espeto. Uma poeira discreta velava a livraria, onde apenas por vezes algum cônego reumatizante e retido nas almofadas da sua cela mandava buscar o D. Quixote, ou as Farsas de D. Petronilla. Espanejada, arejada, bem catalogada, com rótulos e notas traçadas pela mão erudita dos Abades—só a adega...

Não se procure, pois, nesta morada de monges, o precioso sabor das tristezas monásticas; nem as quebradas