Página:A escrava Isaura (1875).djvu/90

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que por inveja ou seja lá pelo que fôr, me olha de revés e só trata de achincalhar-me. Meo Deos! meo Deos!... já que tive a desgraça de nascer captiva, não era melhor que tivesse nascido bruta e disforme, como a mais vil das negras, do que ter recebido do céo estes dotes, que só servem para amargurar-me a existencia?

Isaura não teve muito tempo para dar larga expansão ás suas angustiosas reflexões. Ouvio rumor na porta, e levantando os olhos vio que alguem se encaminhava para ella.

— Ai! meo Deos! — murmurou comsigo. — Ahi temos nova importunação! nem ao menos me deixão ficar sósinha um instante.

Quem entrava, era sem mais nem menos, o pajem André, que já vimos em companhia do feitor, e que mui ancho, empertigado e petulante se foi collocar defronte de Isaura.

— Boa tarde, linda Isaura. Então, como vae essa flor? — saudou o pachola do pajem com toda a faceirice.

— Bem, respondeo secamente Isaura.

— Estás amuada?... tens razão, mas é preciso ir-se accomodando com este novo modo de vida. Devéras que para quem estava acostumada lá na sala, no meio de sedas e flores e agoas de cheiro, ha-de ser bem triste ficar aqui mettida entre estas paredes enfumaçadas que só tresandão a sarro de pito e murrão de candeia.