Página:A ilha maldita (seguido de) O pão de ouro. (1879).djvu/114

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O sol do meio-dia reverberando nos areais produzia calma intensa e opressora.

Ricardo adormeceu e sonhou. Divinos acordes de uma voz melodiosíssima ecoaram a seus ouvidos, banhando-lhe o coração em eflúvios de inefáveis delícias. Esse cantar mavioso parecia partir do seio de uma nuvenzinha branca que, à semelhança de um tufo de alvinitente arminho, vinha boiando sobre as vagas a demandar a praia. Essa nuvem, que gradualmente se adelgaçava, se foi desmanchando em róseo e diáfano vapor, no seio do qual se foram pouco a pouco desenhando as formas esbeltas e graciosas de uma virgem de esplêndida e deslumbrante formosura; uma auréola de luz meiga e serena circundava-lhe toda a figura, que se destacava como em um camafeu do mais rico e primoroso lavor. A virgem continuava a cantar, enquanto seus róseos braços, manobrando com gentil donaire um remo de marfim, fazia resvalar serenamente à flor das ondas um leve e elegante barquinho.

Súbito, parou de remar e de cantar, fitou no mancebo os grandes olhos cheios de comoção e sobressalto, e encarou-o por alguns momentos. Um leve sorriso de afetuosa expressão roçou-lhe os lábios, mas esse sorriso fugaz como um relâmpago apagou-se logo em uma sombra de tristeza, que enturvou-lhe toda a fisionomia. Moveu de