Página:A ilha maldita (seguido de) O pão de ouro. (1879).djvu/228

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A língua rubra e trêmula como a da serpente lambia-lhe a miúdo os lábios secos e descorados; a peçonha do ódio vibrava-lhe todos os músculos, e a fada encantadora se transfigurava em um momento em anjo réprobo precipitado pela cólera celeste das alturas do empíreo na mansão da dor e do eterno desespero.

Ricardo a contemplava transido de terror e de desconfiança. Acaso saberia ela que ele e seus irmãos tinham sido os matadores de seu marido…? As palavras da moça pareciam-lhe um feroz sarcasmo e encerravam-lhe no coração as lâminas aceradas do remorso, e as mais graves e cruéis suspeitas começavam a assaltar-lhe o espírito. Quem sabe se essas meigas palavras, esses protestos de amor, com que até ali o embalara, não eram mais que embaidores laços, cantos de sereia, com que pretendia atraí-lo vítima incauta a um hediondo sacrifício…?! O pavor, o ciúme, o despeito, o remorso traziam-lhe o espírito em tempestuosa agitação. Enfim, já não podendo guardar um silêncio que o torturava:

— Que tens, Regina? — exclamou, fitando nela um olhar penetrante. — Que tens que já não me pareces a mesma…! Ainda há pouco eras toda meiguice e ternura, e agora, como serpente irritada, vibras em redor de ti olhares de fogo, com se te agitasse o demônio da vingança…! Por