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Página:A morgadinha dos canaviais.djvu/250

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de vinho do Porto de promettedora côr de topazio, consistia o resto da mobilia n’uma estante de pinho, vergada sob o peso de in-folios de grossas encadernações e folhas vermelhas nos aparos, em algumas cadeiras e bancos tambem occupados com livros e com varios utensilios empregados nas explorações scientificas do velho, taes como caixas de lata, frascos, martelos, foicinhas, limas, os quaes ainda sobravam para alastrarem o chão.

Todo o recinto era apenas alumiado por um candieiro de azeite, e a escassa luz, que dos tres lumes que, em attenção á solemnidade da noite, o velho accendera, ia reflectir-se no vulto alvacento de um Christo de marfim pendente de um crucifixo negro, que sobresaía n’aquellas paredes nuas e caiadas.

Havia bastante tempo que aquelles dois homens, sentados defronte um do outro, guardavam silencio; um d’esses silencios, durante os quaes os espiritos, como se impacientes com as longuras da palavra, tendo-se desembaraçado d’ella, voam a par, para adeantarem caminho e voltarem mais longe a associarem-se á sua mais lenta companheira.

Augusto, com os olhos fixos na luz que illuminava a scena, parecia alheio a quanto o rodeava.

O herbanario, sem desviar os olhos d’elle, com o braço estendido para o calice que tinha defronte de si, e a cabeça inclinada, parecia espiar, um por um, todos os gestos de Augusto, e estudar n’elles os pensamentos que o preoccupavam. Emfim rompeu o primeiro o silencio:

— Pobre rapaz! Dize-me para ahi tudo o que tens. Para que te mettes a esconder de mim aquillo que eu ha tanto te leio nos olhos, creança?

— O quê, tio Vicente? — perguntou Augusto, inquieto.

— O quê?! Ouve, Augusto. Deu-te Deus o engenho, sem te esfriar o coração: são dons do Céo,