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Página:A mortalha de Alzira (1924).djvu/134

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a remissão das suas culpas. Vamos! Abra-me a sua alma de par em par. Confie-me as suas dores, que eu as farei minhas, e ajudá-la-ei a carregá-las até aos pés do nosso pai supremo!

A embuçada, em vez de responder às palavras do confessor, deixou cair a cabeça sobre os joelhos dele, e abriu a soluçar desesperadamente.

Era um pranto convulso e sem tréguas, que lhe agitava o corpo inteiro, e que menos parecia a dor silenciosa e triste dos arrependidos, do que a explosiva revolta de quem chora pela ausência de uma ventura sensual e terrestre.

Ângelo, por sua vez, estremeceu perturbado e tolhido de alheios sobressaltas. Daquela misteriosa carne de mulher que palpitava a seus pés, erguia-se um quente eflúvio, traiçoeiro e lascivo, que lhe entontecia a alma, um odorante e luxurioso vapor de estranhos vinhos que o enleavam. Dir-se-ia que aquelas lágrimas recendiam a volúpia e que aqueles soluços eram soluços de amor, chorados no sigilo de uma alcova.

Ele ergueu-se, a embuçada segurou-lhe as mãos, cobrindo-as de beijos apaixonados.

Ângelo quis fugir. Ela, com um gesto rápido,

rejeitou o véu que lhe rebuçava as formas, e ali, no sagrado retiro daquela pobre capela de aldeia, surgiu a perigosa Alzira, a terrível condessa de gelo, mais pálida e mais sedutora