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Página:A mortalha de Alzira (1924).djvu/89

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Ângelo continuava a pensar:

— Se o sexo é uma imundície condenada por Deus, por que Deus então fez as suas criaturas aos pares, e por que fez o sexo?. . . Por que os homens não continuam a nascer como Adão e Eva?... "Por castigo" diz a Escritura Sagrada... Logo, a procriação não é um bem, é um mal; logo, o mundo inteiro é um purgatório, e a vida um tormento!. . .

As borboletas começaram de novo a doudejar no espaço.

— E estas desgraçadinhas, interrogou Ângelo a si mesmo; estas também pecaram no Paraíso, para que Deus as obrigasse a viver e procriar?. . .

As borboletas, redobrando de impaciência' iam e vinham por toda a cela, à procura de uma saída.

O padre compadeceu-se delas e quis dar-lhes o ar livre. Foi abrir a janela, mas encontrou resistência; os gonzos oxidados não queriam acordar do seu ferruginoso sono de vinte anos. Ângelo empregou toda a força e conseguiu afinal abri-la.

Um jacto de luz alegre e cantante inundou a fria prisão. Um mundo de vida patenteou-se no ar, à doiradora claridade que vinha lá de fora.

O presbítero correu às grades da janela.

— Que belo! Que belo! exclamou ele, defrontando com extensa paisagem que se descortinava aos seus olhos deslumbrados.