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Defronte do orador estava um frade, que pelo hábito negro, os cordões brancos e as alpertacas se conhecia ser dos mendicantes. Era também cheio do corpo, mas de uma obesidade balofa, que não sobressairia tanto, se não fosse a fradesca indolência com que ele se entulhava sobre si mesmo, metendo a cabeça pelos ombros e o ventre pelos quadris.

Com os olhos abotoados e a comer a boca do orador, por vezes tentara o frade tomar-lhe a palavra, e afinal decidiu-se a arrancá-la à viva força. Mas o guincho do letrado lhe retalhara como uma navalha a voz de baixo profundo, por modo que era impossível perceber-se uma sílaba.

Reconhecendo de longe nos dois émulos o Padre-Mestre Frei João de Lemos, da Ordem de São Francisco, e o Bacharel Dionisio Mendes Duro, que fazia profissão de letrado forense, o licenciado desconjuntou-se na guinada do costume, e fendida a mó de gente com um rasgo da enorme bengala, surdiu avante.

Os três sujeitos que ali estavam em trempe, no centro da pinha de gente, eram tidos e havidos pelo bom povo fluminense como as três grandes luminárias da época.

Ao frade, reputavam o primeiro pregador do século.