Página:Amor de Perdição (1862).pdf/123

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soubesse que o menino cá estava, ia tudo razo lá em casa. Ora ahi está.

— E não lhe fallou nos criados de Balthazar?

— Nem um pio!.. Lá na cidade ninguem já fallava n’isso hoje.

— E que lhe disse da senhora D. Thereza?

— Nada, senão que ella fôra para o convento. Agora, deixe-me ir amantar a egua, que está a escorrer em fio. Ó rapariga, traz-me cá a manta.

Em quanto Simão contava onze moedas menos um quartinho, maravilhado da estranha liberalidade, Marianna, abraçando o pae no repartimento visinho da casa, exclamava:

— Arranjou muito bem a mentira!...

— Ó rapariga, quem mentiu foste tu! Aquillo lá o arranjaste tu com essa tua cabecinha! Mas a coisa sahiu ao pintar, heim? Elle comeu-a que nem confeitos! Anda lá, que ficaste sem os bezerros; mas lá virá tempo em que elle te dê bois a troco dos bezerros.

— Eu não fiz isto por interesse, meu pae... — atalhou ella resentida.

— Olha o milagre! isso sei eu; mas, como diz lá o dictado, quem semeia colhe.

Marianna quedou pensativa, e dizendo entre si: — Ainda bem, que elle não póde pensar de mim o que meu pae pensa. Deus sabe que não tenho esperanças nenhumas interesseiras no que fiz.