Página:Amor de Perdição (1862).pdf/157

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n’um dos quartos melhores do carcere; mas nú e desprovido de tudo o carcere.

Um outro prêso emprestou-lhe uma cadeira de pau. Simão sentou-se, cruzou os braços, e meditou.

Pouco depois, um criado de seu pae conduziu-lhe o almoço, dizendo-lhe que sua mãe lh’o mandava a occultas, e entregando-lhe uma carta d’ella, cujo conteúdo importa saber. Simão, antes de tocar no almoço, cujo cabaz estava-no pavimento, leu o seguinte:

«Desgraçado, que estás perdido!

Eu não te posso valer, porque teu pae está inexoravel. A occultas d’elle é que te mando o almoço, e não sei se poderei mandar-te o jantar!

Que destino o teu! Oxalá que tivesses morrido ao nascer!

Morto me disseram que tinhas nascido; mas o teu fatal destino não quiz largar a victima[1].

Para que sahiste de Coimbra? a que vieste, infeliz? Agora sei que tens vivido fóra de Coimbra ha quinze dias, e nunca tiveste uma palavra que dissesses a tua mãe!...»

Simão suspendeu a leitura, e disse entre si:

  1. Esclarece este dizer de D. Rita a certidão de idade de Simão, a qual tenho presente, e é extrahida por Herculano Henrique Garcia Camillo Galhardo, reitor da real Igreja da Senhora da Ajuda, do livro 14, a folhas 159 v. Reza assim:

    «Aos dois dias do mez de maio de 1784, pôz os santos oleos o reverendo padre cura João Domingues Chaves a Simão, o qual foi baptisado em casa em perigo de vida pelo Reverendo Frei Antonio de S. Pelagio, etc.»