Página:Amor de Perdição (1862).pdf/264

Wikisource, a biblioteca livre

lh’a da respiração, que não embaciou levemente o vidro.

— Está morto!... — disse elle.

Marianna curvou-se sobre o cadaver, e beijou-lhe a face. Era o primeiro beijo. Ajoelhou depois ao pé do camarote com as mãos erguidas, e não orava nem chorava.

Algumas horas depois, o commandante disse a Marianna:

— Agora é tempo de dar sepultura ao nosso venturoso amigo ... É ventura morrer quando se vem a este mundo com tal estrella... Passe a senhora Marianna ali para a camara, que vai ser levado d’aqui o defuncto.

Marianna tirou o masso das cartas debaixo do travesseiro, e foi a uma caixa buscar os papeis de Simão. Atou o rolo no avental, que elle tinha d’aquellas lagrimas d’ella choradas no dia da sua demencia, e cingiu o embrulho á cintura.

Foi o cadaver envolto n’um lençol, e transportado ao convez.

Marianna seguiu-o.

Do porão da nau foi trazida uma pedra, que um marujo lhe atou ás pernas com um pedaço de cabo. O commandante contemplava a scena triste com os olhos humidos, e os soldados, que guarneciam a nau, tão funeral respeito os acurvava, que insensivelmente se descobriram.

Marianna estava, no entanto, encostada ao flanco da nau, e parecia estupidamente encarar aquelles empuxões,