Rio, 31 de dezembro de 1854
Antes de tudo, preciso contar-vos um caso singular que me sucedeu há dois dias.
Tinha acabado de ler os contos de Hoffman, sentei-me à mesa, cortei as minhas tiras de papel, e ia principiar o meu artigo, quando chegou-me uma visita inesperada.
Se algum dia fordes jornalista, haveis de compreender como é importuno o homem que vem distrair-vos, justamente no momento em que a primeira idéia, ainda em estado de embrião começa a formar-se no pensamento e quando a pena impaciente espera o primeiro sinal para lançar-se sobre o papel.
Haveis de ver que não há nada neste mundo que se lhe compare; nem mesmo o sujeito que vem interromper-vos precisamente na ocasião em que ides fazer uma declaração de amor, ou o maçante que vos agarra e vos faz perder a hora do ônibus ou da barca.
Por isso, podeis imaginar com que mau humor, e com que terrível disposição de espírito, me prepararei para receber a tal visita, que escolhera uma hora tão imprópria, a menos que não fosse uma mulher bonita, para quem estou persuadido que não se inventaram os relógios.