Página:Ao correr da pena.djvu/281

Wikisource, a biblioteca livre

Pensem que turbilhão de idéias, que torvelinho de pensamentos, me agitava a mente exaltada por este fato. Visões fantásticas surgiram de repente começavam a dançar um sabbat vertiginoso no meu cérebro escandecido.

Via cenas do Roberto do Diabo, de Macbeth, do Paraíso Perdido e da Divina Comédia, mais bem pintadas do que as de Bragaldi, de Dante, de Milton, e de todos os pintores e poetas do mundo.

Enfim, decidi-me e fui almoçar.

O almoço - e especialmente o almoço diplomático e parlamentar - é um dos mais poderosos calmantes que eu conheço. Atua sobre o espírito pelo sistema homeopático.

Se este ano pudesse haver a mais pequena sombra de oposição, aconselharia os ministros que pusessem em voga nesta estação os almoços parlamentares.

Depois de almoçar, senti-me mais senhor de mim, e pude refletir friamente sobre a posse da minha luneta.

Lembrei-me que era escritor, e avaliei o alcance imenso que tinha para mim aquele vidro mágico.

Bastavam-me três ou quatro coups de lorgnon, para escrever uma revista que antes me roubava bem boas horas de descanso e sossego.

Não precisava mais estar preso a uma banca, a escrever, a riscar, a contar as tábuas do teto em busca de uma idéia a esgrimir contra a musa rebelde.

O meu folhetim tornava-se um agradável passeio, um doce espaciar, olhando à direita e à esquerda, medindo a calçada a passos lentos, e rindo-me das coisas engraçadas que me revelaria a minha luneta.

Assim, pois, não é um artigo ao correr da pena que ides hoje ler, mas um simples passeio, uma revista ao correr dos olhos

São duas horas.

É a hora da flânerie parlamentar.

Lá vêm braço a braço dois deputados oposicionistas.