Página:Ao correr da pena.djvu/316

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mas também é prova que o salão do teatro não se presta a uma reunião de mais de quinhentas pessoas.

Do contrário, dar-se-á o que sucedeu terça-feira, a se verão obrigados a fazer aquela mesma separação de homens e senhoras, que decerto não é nada galante.

A música é uma coisa muito bela, mas seguramente não é um fogo de Vesta que tenha o poder de nos afastar da companhia amável das senhoras e privar-nos da sua espirituosa conversação.

Não cuidem que digo isso por mim; apesar de sentir bastante aquela separação anti-social, anti-religiosa e anti-política, se tomo o negócio tão a peito, é unicamente por causa das senhoras, que eu adivinho haviam de estar desesperadas.

Os motivos do desespero são diversos.

Em umas era porque lhes faltava o quer que é, porque não ouviam uma fineza, não sentiam em torno o murmúrio de admiração a que estão talvez habituadas.

Em outras é porque não tinham quem lhes fosse ver o copo d'água, quem lhes dissesse de que maestro era a música que se tocava, quem informasse da hora que era, enfim quem lhes servisse de partner num pequeno jogo de alusões maliciosas. .

Mas deixemos os desconcertos, e voltemos ao concerto.

As glórias musicais da noite couberam a um trio do Padre Martini, composto em 1730, e que Ferranti foi desencavar não sei onde: é o trio das risadas.

Foi executado pela Charton e por Ferranti e Dufrene com muita graça e naturalidade.

Que excelente música para quando se está triste! Diz um provérbio que quem canta seus males espanta. O tal terceto, porém, faz mais do que espantar os males; obriga a rir; começa-se cantando, e acaba-se às gargalhadas.

Voltemos outra página.

Entramos no Teatro de São Francisco na quarta-feira à noite; representam-se duas pequenas comédias muito engraçadas e espirituosas.