dos flamengos, alimentavam profundo rancor contra os seus malfeitores; padres e frades espoliados e expulsos irritavam a consciência religiosa. O sucessor de Montalvão, Antônio Teles da Silva, tão abrasado católico que quis fundar e dotar à sua custa um Santo Ofício para o Brasil, a exemplo de Goa, onde estivera, não podia suportar herejes na vizinhança.
Ainda no tempo de Nassau a religião católica gozava de tolerância embora limitada e instável. Com sua partida, protestantes e judeus ultrajavam a toda hora as crenças da população indígena. Por isso o primeiro título assumido pelos chefes dos insurgentes foi o de governadores da liberdade divina: em linguagem moderna tanto valeria dizer da liberdade de consciência.
Da Bahia devia partir a iniciativa contra o flamengo, pois só de lá podiam sair o armamento, os oficiais, a gente de guerra, em torno da qual se adensassem os pernambucanos bisonhos; precisava-se, entretanto, de um chefe em Pernambuco, para o esforço não ficar perdido nos primórdios.
Um só homem havia ali capaz de assumir esta responsabilidade, se quisesse: João Fernandes Vieira. Natural da ilha da Madeira, passara aos onze anos para aquela capitania, batera-se ao lado de Matias de Albuquerque, e foi um dos prisioneiros do arraial de Bom-Jesus, em junho de 635. Preferiu ficar com os holandeses, depois da rendição, e a sorte protegeu-o. Adquiriu a maior fortuna da terra. Os compatriotas respeitavam-no, e ele os ajudava e protegia liberal e generosamente. Conciliou igualmente as graças dos invasores. Por que artes explica-o no seu testamento: “Também me são devedores [os flamengos]de mais de cem mil cruzados, que no decurso de oito ou nove anos lhes dei por remir minha vexação e por segurar a vida de suas tiranias, de peitas e dádivas a todos os governadores e seus ministros e com grandiosos banquetes que ordinàriamente lhes dava pelos trazer contentes”.
À primeira vista ninguém menos próprio para o papel de herói