Página:Carta posthuma de D. Pedro Duque de Bragança.pdf/11

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Brasileiros,

Chegado à epoca solemne, em que o homem entrega a sua alma nas mãos do seu Creador , quando toda illusão se dissipa , toda paixão se cala , quando a consciencia acordada pronuncia sem appello, quando a porcão immortal do ser humano, proxima a deixar o fragil despojo á que se vio unida na sua carreira terrestre, deita o ultimo olhar sobre os actos desta carreira que ambos percorrêrão entre trevas e trabalhos , e ja illuminada pela luz da eterna verdade antecipando a sentença do Supremo Juiz, mas pelo derradeiro esforço do nó que se rompe , saudosa da miseravel condição do ente mortal que animou, vive novamente, em poucos instantes, todo o decurso da existencia transacta, e repisa, em globo todas as emoções outrora sentidas, huma irresistivel sympalhia, huma saudade sem par, me chama para vós! Brasileiros! eu sou vosso patricio, vosso patricio por escolha, por adopção, por voluntaria dedião de alma! embora nascesse eu em Portugal ! he no Brasil que eu nasci ao sentimento de mim mesmo, he no Brasil, sob o seu benigno Ceo, seu sol resplandecente, no seio da sua virginal e incomparavel natureza, que minha juventude floreceo, e que a vida com os seus mysterios, a mocidade com os seus encantos, se manilestarão á minha alma ; he no Brasil que eu fui filho, esposo, pai, cidadão, Soberano, Legislador, Fundador de hum Imperio!.... O' recordações inelfaveis, cujo peso me opprime o coração!.. mas eu vos devo apartar de mim ; a tempestade que levantarieis, perturbaria o socego de espirito de que eu preciso nesta occasião, que ha de ser unica. São altas horas da noute. Minha cara Amelia, exemplar de fidelidade e de dedicacão, recostada no pé do meu leito, succumbio por instantes ao cansaço dos seus incessantes desvelos. Ao redor de mim tudo dorme, excepto o amigo que escreve esta