Página:Carta posthuma de D. Pedro Duque de Bragança.pdf/12

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carta ensopada das suas silenciosas lagrimas. Meu estado não me consente escrever ; porem jamais minha intelligencia esteve tão clara e tão viva ; jamais abrangi tão de alto , e tão despidas da nuvem das preoccupações, as cousas humanas. Até os crueis padecimentos que me assaltão, fizerão alguma tregoa, como para que nada offuscasse a aguda serenidade da minha mente ; á modo que antevejo o porvir : Este he o privilegio dos moribundos.

Brasileiros! eu vos dedico os ultimos vislumbres desta luz proxima a se apagar; eu vo-los devo. Ja estou quite com Portugal. Paguei plenamente à divida que contractei com o meu nascimento; regenerei suas instituições; dei-lhe huma Constituição, e duas vezes a liberdade, e por elle morro na flor dos meus annos. Mas comvosco, Brasileiros, a minha consciencia não me outorga tão satisfactorio testemunho. Terei cumprido com todos os deveres de Fundador de Imperio? Mas? o foro interior me accusa de ter parado na metade da tarefa. Sem duvida eu vos suavisei o caminho da Independencia ; eu vos salvei da horrenda anarquia que devora vossos vizinhos ; eu vos dei hum pacto social concorde com a vossa civilisação, e que reformado à proporção que esta civilisação progredir, corresponderá a todas as exigencias de vosso futuro ; porem não era bastante redigir e promulgar esta Constituição ; preciso fôra dar-lhe o indispensavel andamento promulgando previa, ou simultaneamente todas as leis organicas e Codigos de que ainda em parte careceis depois de doze annos ; preciso fôra extirpar todos os abusos, renovar as notabilidades, levar o progresso em todos os ramos da existencia social, tomar a iniciativa de todo melhoramento; pegar eu mesmo na espada quando se combatia, no machado para romper matos, na enchada e pá