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CARTAS DE INGLATERRA
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Basta abrir os livros dos seus grandes homens, desde Thackeray, o artista, que com um tão frio rancor lhe fez a satyra sangrenta, até Carlisle, o philosopho, que passou a existencia a fulminal-a com uma tumultuosa colera de propheta...

Da Inglaterra póde-se dizer que — ao contrario da generosa França — as suas virtudes só a ella aproveitam e os seus vicios contaminam o mundo.

É á Inglaterra que se deve o egoismo crescente que nos vae petrificando o coração — esse egoismo tão particularmente inglez, que faz com que em Hyde-Park, no seu centro de luxo, trezentas pessoas, em torno de um lago, vejam uma pobre criança afogar-se, sem que nenhuma se encommode a tirar o charuto da bocca para lhe estender uma taboa! É á Inglaterra que devemos esta crescente hypocrisia que invade o mundo, e que faz com que em Londres, nos cartazes que annunciam as peças de Sardou ou Dumas, se ajunte esta estupenda declaração: adaptada ás justas exigencias da moralidade ingleza; — emquanto que, na rua, por baixo d’esses mesmos cartazes, rola, sem cessar, a mais vil torrente que o mundo viu de bebados e de prostitutas!

Mas deixemos as maculas da Inglaterra: a lista é longa; — quero só alludir a um outro abominavel defeito que ella sempre teve, e que agora desenvolveu