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CARTA DE GUIA DE CASADOS

e de haver eu dito multo, daqui não tirássemos algum proveito.

Rematarei com as generalidades que, a meu parecer, avultam bem a grandeza das casas ; isto como conclusão do muito que nestes pontos havia que dizer.

Ben vejo eu que se chegar e ser lido de alguma casada, ou casado (e mais ainda dos que estiverem para o ser) acharão medonho êste caminho, por onde pretendo guiá-los à prometida casa do descanso. Porque dirão êles o estão vendo cheio de abrolhos, e cautelas, que apenas parece poderá passá-lo a consideração, quanto mais a obra.

Dir-lhe hei a tôdas, que nesta carta sucede o que nas cartas de marear, que quem as vir assim cruzadas de linhas, e riscos, que se comem uns aos outros, parece que de tal confusão não pode haver quem se desempece ; e na verdade não é assim ; porque aqueles linhas tôdas são umas próprias, e apenas passam de quatro principais ; mas para fazer mais fácil o nosso uso, se multiplicam.

Quem com bom juízo considerar esta máquina de cousas, as verá tam semelhantes, atadas, e dependentes umas de outras, que não lhe parecerão muitas, mas uma só. E porque, como vêmos, a corda de poucos fios se quebra fàcilmente, se com ela apertam muito ; por isso é necessário tecer e torcer de muitos avisos, e remédios esta corda, de que está pendurada a honra, vida, e salvação dos casados ; porque com as fôrças do vício se nos não rompa. E como tôdas elas costumam quebrar pelo mais fraco, e esta fraqueza é própria da mulher ; por essa mesma razão convêm fortificá-la de sorte, com tanta cautela, e arte, que por mais que tire a ocasião, sempre se conserve sã, e inteira.