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Página:Contos Tradicionaes do Povo Portuguez.pdf/217

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O moleiro pôz-se a rir, e disse-lhe que não tivesse cuidado, que lhe emprestasse o habito de frade, que elle iria disfarçado e havia de dar boas respostas ao rei.

Passados os trez dias, o moleiro vestido de frade, foi pedir audiencia ao rei. O rei perguntou-lhe:

— Então, quanto pesa a lua?

— Saberá vossa magestade que não póde pesar mais do que um arratel, porque todos dizem que ella tem quatro quartos.

— É verdade. E agora: Quanta agua tem o mar?

Respondeu o moleiro:

— Isso é muito facil de saber; mas como vossa magestade só quiz saber da agua do mar, é preciso que primeiro mande tapar todos os rios, porque sem isso nada feito.

O rei achou bem respondido; mas zangado por vêr que Frei João se escapava das difficuldades, tornou:

— Agora, se não souberes o que é que eu penso, mando-te matar!

O moleiro respondeu:

— Ora, vossa magestade pensa que está fallando com Frei João Sem Cuidados, e está mas é fallando com o seu moleiro.

Deixou cair o habito de frade e o rei ficou pasmado com a esperteza do ladino.

(Coimbra.)



72. JOÃO RATÃO (OU GRILLO)

Havia um homem que era carvoeiro, e não gostando d’aquella vida, metteu-se a ser adivinhão. Foi ter á côrte do rei, e disse que tinha officio de adivinhar. Ora na côrte tinha-se feito por aquelles dias um grande roubo, e o rei queria descobrir os criminosos; mandou vir João