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CONTOS E PHANTASIAS

egreja o modesto ataúde, ia o tio Sebastião curvado, melancolico, com o seu rosto barbeado, e cheio de bondade e lhaneza.

Carlota, que chorava a um canto do albergue, com as mãos atadas á cabeça despenteada, ao vêr entrar o bemfeitor, não lhe agradeceu as esmolas com palavras ociosas — arrastou-se para elle de joelhos, e agarrando-lhe nas mãos beijou-as com devota soffreguidão.

Passados tempos o tio Sebastião esquecera-se d’aquelle episodio, e nem sequer reparou que a melhor cantadeira do logar, que inquestionavelmente era a Carlota, deixava de cantar todas as vezes que elle passava por uma certa azinhaga...

Se elle volvesse o rosto veria no meio das hervas altas e humidas, ou em cima dos castanheiros folhudos e entrelaçados de pampanos, um vulto de mulher voltado para elle, a devoral-o com a vista, a seguil-o, a banhal-o na luz cariciosa de um longo olhar enamorado.

Não deu por tal o tio Sebastião; Joanna, porém, que era amiga de Carlota, adivinhou o segredo, e o resultado sabe-o o leitor.