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CONTOS PARAENSES
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segui para o rio Madeira, afim de explorar em meu unico proveito a ingênua simplicidade dos seringueiros.

"Não me falharam os calculos: mezes depois voltei ao Pará, e adquiri maior carregamento, que fui de novo impingir ás remotas regiões do alto Madeira, onde os jacarés e onças respeitaram-me sempre a delicada posição de inoffensivo estrangeiro, que carece de protecção, que não deve ser offendido nunca em um paiz amigo!"

Calou-se. Em sua larga bôcca de expressão franca e descuidosa estava o eterno sorriso zombeteiro, aquelle sorriso sympathico, que me attraía para esse homem com toda a enorme força de um robusto affecto nascente.

 

Accendeu um charuto e continuou:

— "Para encurtar prolixidades: seis annos depois de nossa fallencia, eu regressava definitivamente ao Pará, trazendo uma solida fortuna amoedada em bons contos de réis palpaveis, em notas do Thesouro, no fundo da mala. Tratei logo de cumprir as imposições de um dever: paguei a todos os crédores da massa fallida, sem excepção de um só! Uma d’essas dividas da firma era uma anquinha, — uma anquinha! — que meu socio havia comprado para a sua Venus andaluza! Fiquei ainda com bastante dinheiro, com que estabeleci-me pela segunda vez, — d’essa